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Um ano de recomposição

Fonte: Valor Econômico

Por Alessandra Bellotto e Sérgio Tauhata | De São Paulo

O segmento de previdência privada caminha para fechar 2014 com aumento no ritmo de captação de recursos em relação ao observado em 2013, quando o saldo de aplicações diminuiu. No acumulado do ano até novembro, segundo pesquisa realizada pelas consultorias NetQuant e Towers Watson com 924 fundos de previdência, os investimentos nos planos PGBL e VGBL superaram os resgates em R$ 23,9 bilhões, um crescimento de 12,6% na comparação com o mesmo período de 2013. Só em novembro, os fundos de previdência atraíram R$ 3,46 bilhões, alta de aproximadamente de 13%.

A melhora do apetite pela previdência neste ano deve-se à recuperação dos retornos pelos fundos, especialmente de renda fixa, afirma Edson Franco, diretor-superintendente da Zurich Santander Brasil. No acumulado do ano até novembro, essas carteiras renderam, em média, 8,76%, enquanto o Certificado de Depósito Interfinanceiro (CDI), principal referência para aplicações conservadoras, teve variação de 9,76% no período. Já os multimercados renderam 9,14%.
 
 
 
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O ano de 2013 foi de muita volatilidade, lembra Franco, o que reduziu o ritmo de captação, motivado pelas próprias casas. No pano de fundo, estava uma resolução do governo obrigando os gestores a iniciar ainda no primeiro semestre o alongamento do prazo médio de suas carteiras, com exposição maior em títulos prefixados e mais longos. O problema é que a indústria foi pega no contrapé pela volta do ciclo de alta de juro na ocasião, o que gerou prejuízos para algumas carteiras com a marcação a mercado dos títulos e levou à fuga de investidores - em julho de 2013, pela primeira vez em cinco anos, os saques superaram as aplicações, movimento que se repetiu no início deste ano.

Na avaliação do superintendente de investimentos da Brasilprev, Altair César de Jesus, neste ano os títulos mais longos passaram por um movimento de recomposição da perda de 2013. "A volatilidade do ano passado abriu uma janela para a volta da rentabilidade em 2014", pondera. Segundo o executivo, embora o atual ciclo da Selic seja de alta, a atratividade da renda fixa pode voltar a ganhar reforço no fim de 2015, se houver uma janela de fechamento de taxas após o encerramento do aperto monetário atual. Conforme Jesus, o mercado ainda espera mais duas altas da taxa básica no ano que vem.

Apesar da retomada do crescimento, o setor ainda está longe de recuperar o ritmo da última década, na casa de 20% em termos de captação. A estagnação da economia, destaca Franco, da Zurich Santander, também provocou reflexos na previdência. "As pessoas ficam mais receosas na hora de decidir onde investir", afirma.

Sérgio Prates, superintendente de produtos de previdência da Icatu Seguros, conta que na sua base de clientes aumentaram os resgates para fazer frente a dificuldades financeiras - foram 70% os pedidos de saques nesse contexto. A seguradora registrava, contudo, captação líquida de R$ 567 milhões até novembro.

O executivo afirma, ainda, que o ritmo de crescimento da previdência só não foi mais pujante, entre outros fatores, porque o investidor ainda está machucado com o desempenho negativo de fundos de renda fixa em 2013. "O cliente não suporta cota negativa em renda fixa, e quando ele olha um histórico maior de prazo, de 12, 24 meses, o desempenho ainda está prejudicado", ressalta.

Com R$ 16 bilhões em captação líquida no ano até novembro, a Brasilprev não só lidera o ranking entre as seguradoras, como também responde por 66,7% da arrecadação líquida da previdência privada aberta em 2014. De acordo com Guilherme Rossi, superintendente comercial da companhia, o trabalho de captação de clientes junto à base do Banco do Brasil ajudou a impulsionar os resultados. "A gente conta com uma rede de distribuição muito ampla e capilarizada que é a rede do BB e, sem dúvida, o trabalho dessa distribuição e captação é bastante responsável [pelo resultado]", afirma.

Rossi cita também o esforço de venda consultiva para esclarecer os investidores sobre as características dos produtos e a importância da visão de longo prazo. "Essa consultoria ajuda os aplicadores a não cair na armadilha da volatilidade de curto prazo."

Apesar do conceito de longo prazo, o investidor de previdência, afirma Prates, da Icatu, é conservador, ou seja, pensa no curto prazo e olha só o CDI. E esse comportamento, na visão do executivo, fica mais evidente em períodos de incerteza como o atual. "O investidor tem privilegiado a preservação de capital", afirma, referindo-se tanto à preferência por previdência atrelada ao CDI quanto por títulos incentivados, como letras de crédito imobiliário e do agronegócio, que foram os grandes concorrentes do setor de fundos ao longo do ano.

Prates conta que, nos canais de distribuição dos bancos de varejo em que está presente, a Icatu não consegue vender fundos de inflação, por exemplo. Falta esclarecimentos e disposição para esperar pelos retornos, que vêm no longo prazo, pondera.

Não à toa, os fundos de renda fixa tradicionalmente concentram a captação. Em novembro, essas carteiras atraíram R$ 3,668 bilhões e, no acumulado do ano, R$ 26,490 bilhões. Já os multimercados, que têm mais liberdade para investir, podendo ficar expostos a taxas prefixadas e atreladas à inflação, receberam pouco mais de R$ 16 milhões no mês e R$ 1,157 bilhão no ano. Em termos de patrimônio, a renda fixa concentra 90,5% dos R$ 368,4 bilhões de ativos totais

Também os fundos com exposição em renda variável vêm amargando resgates desde 2011, por conta do desempenho ruim da bolsa. Neste ano, as carteiras com parcela de até 15% em ações tiveram saques de R$ 70,8 milhões em novembro e R$ 1,151 bilhão no acumulado; os fundos com até 30% em renda variável perderam R$ 75,8 milhões no mês e R$ 1,371 bilhão no ano; e os com até 49% registraram resgates de R$ 77,7 milhões em novembro e R$ 1,274 bilhão no ano.

Em termos de desempenho, no acumulado do ano, o retorno foi de 7,41% no caso das carteiras com até 15% em ações; de 7,07% para as carteiras com até 30% e de 6,36% nos fundos com até 49% em bolsa - o Ibovespa, principal índice da bolsa, variou 6,13% e o CDI, 9,76%, no ano até novembro.

Apesar dos resultados negativos das carteiras com parcela de renda variável, Altair de Jesus, da Brasilprev, vê possibilidade de uma recuperação desses portfólios em meados do próximo ano, com uma melhora da atividade associada a uma eventual antecipação de queda de juros. "Embora deva ser um período de ajustes [na economia], 2015 terá um crescimento do PIB maior que este ano", pondera.

O gestor também considera no cenário do ano que vem a possibilidade de o Banco Central iniciar um movimento de ajuste da Selic para baixo ou de a curva de juros futuros antecipar esse movimento já no fim de 2015, o que poderia ajudar o mercado acionário. "Se a gente olhar agora, o mercado futuro não está precificando uma mudança de ciclo monetário, mas em meados de 2015 vai haver uma parada dos juros e [o mercado vai] começar a olhar pra baixo, por exemplo, um eventual afrouxamento em 2016", considera.

O superintendente da Brasilprev explica que, embora o movimento de juros seja difícil de antever, ele confia em um patamar mais baixo da Selic no longo prazo. "Tudo vai depender do cenário econômico internacional e doméstico. Mas quando a gente olha para o longo prazo, com certeza a taxa de juros será de um dígito", diz. Um movimento de curva para baixo, lembra o gestor, traz uma "volatilidade positiva" para a renda fixa mais longa, com valorização desses títulos. "Em 2015 e 2016 talvez seja hora de [o investidor] fazer ajustes para outras estratégias com uma renda fixa mais longa ou mesclar renda variável simultaneamente", afirma o gestor.

Para 2015, a previsibilidade da nova política econômica do governo vai incentivar o crescimento da previdência aberta no próximo ano, segundo Osvaldo Nascimento, presidente da Federação Nacional de Previdência e Seguros de Vida (Fenaprevi). "Apesar da previsão de crescimento baixo do PIB para o ano que vem, o setor de previdência tende a crescer mais do que este ano, pois a escolha da nova política econômica traz mais transparência para o jogo", disse Nascimento em encontro com jornalistas. "Previsibilidade no longo prazo é importante para a previdência."

De janeiro a outubro deste ano, a arrecadação (bruta) dos planos de previdência aberta cresceu 10,2%, totalizando R$ 61,7 bilhões, segundo dados da Susep compilados pela Confederação Nacional das Seguradoras (CNSeg). Para 2015, a projeção é de crescimento de 10,5%. (Colaborou Thais Folego)
 

 

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