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Reflexões para o mercado de Vida e Previdência em 2011 e 2012

Fonte: Funenseg - Cadernos de Seguros

Por Samy Hazan

Fazer prognósticos sobre o futuro de um mercado é sempre uma tarefa difícil e arriscada. Não pretendo aqui fazer nenhum exercício de futurologia, mas sim arriscar-me numa reflexão sobre os principais vetores que deverão moldar a indústria de seguros no Brasil nos próximos anos. Vamos então às principais tendências:

O lócus do crescimento e do otimismo do mercado mudou permanentemente para as economias emergentes

Os dados de nossa economia continuam apontando para um forte crescimento nos próximos anos, criando um cenário extremamente otimista para o mercado de seguros. Cresce a taxa de investimento e o crédito atinge níveis recordes. A taxa de desemprego é a menor da série histórica do IBGE (6% no final de 2010), o que estabelece condições propícias para o mercado de benefícios corporativos e seguros em geral.

Ainda segundo estudos da SwissRe, o crescimento mundial do mercado de Seguro de Pessoas (Vida & Previdência) tem sido impulsionado pelos mercados emergentes, cuja participação de mercado saltou de 10,5% em 2007 para 16,7% em 2009, graças a um crescimento bem mais robusto em relação aos mercados maduros. O lócus do crescimento e do otimismo do mercado mudou definitivamente para os mercados emergentes.

O mercado brasileiro de seguros de pessoas tem chamado muito a atenção de seguradores e investidores estrangeiros em geral. O Brasil finalmente está pronto para celebrar sua entrada no grupo dos países mais desenvolvidos e influentes.

Novas companhias estrangeiras deverão entrar no mercado brasileiro, nos próximos anos, numa estratégia de fugir da estagnação econômica em seus países de origem. O Brasil apresenta inúmeras vantagens em relação a outros mercados emergentes, uma vez que conta com um setor financeiro rígido, desenvolvido e sofisticado. Também é o país mais bancarizado da América Latina, sem contar outros fatores positivos, por exemplo: a estabilidade política, o idioma único e a ausência de problemas étnicos e religiosos, comuns na região.

A nova demografia do Brasil

Como citado anteriormente, a estabilidade econômica mantida até agora é um dos pilares do atual vigor do mercado de seguros brasileiro. Preservá-la é condição para que as coisas continuem assim no nosso segmento. O outro vetor, menos perceptível talvez, mas extremamente relevante, é a transformação benigna da demografia do país.

O Brasil vive hoje uma transição que a grande maioria dos países ricos já passou, resultado de mudanças que começaram a ocorrer seis décadas atrás. Nos anos 1950, a população brasileira apresentava elevadas taxas de crescimento, fruto da combinação de uma natalidade alta com a redução da mortalidade infantil. A população crescia à média de 3% ao ano; taxa que, nas décadas seguintes, caiu até o 1,4% atual. Com a tendência de queda da fecundidade, o Brasil deverá alcançar o máximo de 264 milhões de habitantes em 2062, e daí em diante a população entrará em declínio, segundo o IBGE. Importante lembrar que a situação demográfica atual em vários países desenvolvidos é de decréscimo populacional, fator que restringe o crescimento do mercado de seguros.

Concomitantemente, a expectativa de vida do brasileiro cresceu da média de 51 anos em 1950 para quase 74 atualmente. Nesse ritmo de avanço, até 2050, ao nascer, os brasileiros terão uma esperança de vida de 81 anos, segundo o IBGE, mesma taxa hoje verificada entre os japoneses, o povo com a maior longevidade do mundo.

O aumento da expectativa de vida tem ampliado a percentagem de adultos e idosos na população brasileira. Essas mudanças demográficas têm alterado o mix dos produtos de seguro no Brasil, reflexo de uma geração mais preocupada com o problema de se viver por muito mais tempo: a maior proporção dos prêmios de seguros está indo para o segmento da aposentadoria e produtos com benefícios em vida, como o VGBL, seguros para INVALIDEZ e o DOENÇAS GRAVES (paga um benefício em vida por diagnóstico de uma doença grave coberta).

Essa tendência de maior proporção dos prêmios migrarem para produtos de aposentadoria e benefícios pagos em vida deve continuar no Brasil, a exemplo do que vimos nos mercados desenvolvidos e pelas razões citadas.

Atração de novos mercados e o novo perfil do consumidor brasileiro

O Brasil passa por uma transformação sem precedentes no perfil de seus consumidores - a criação de um mercado consumidor de massa, forte e cada vez mais complexo, que será, junto com os investimentos em infraestrutura, o grande motor do crescimento do mercado de seguros nos próximos anos.

A classe média assumiu um papel preponderante na economia durante os últimos anos. Milhões de brasileiros têm aproveitado o bom momento da economia para experimentar, pela primeira vez, a experiência do consumo de bens e serviços, aumentando a demanda por produtos de proteção como funeral, prestamistas, perda de renda (desemprego), vida e acidentes pessoais.

O mais novo mercado que deverá surgir, fruto dessa criação do mercado de massa no Brasil, são os seguros populares e o microsseguro.

Diversos estudos têm enfatizado a relevância do microsseguro como uma solução eficaz e viável de gestão de riscos para os indivíduos de baixa renda. O microsseguro, que tem o potencial de cobertura de cerca 80 milhões de pessoas no Brasil, concentra-se em poucos riscos hoje, mas o seu alcance deve ser ampliado. Trata-se de um novo nicho com probabilidade de atrair muitos resseguradores e seguradores nos próximos anos em função de seu potencial futuro. O microsseguro ainda ajudará a melhorar a estabilidade social e suportará uma ampla base de desenvolvimento econômico.

O fator crítico de sucesso para atração desses novos mercados é a simplificação do processo de contratação dos seguros dentro do mercado “popular” e de microsseguro.

Outro segmento que deverá atrair a atenção de muitos seguradores é o feminino, cuja presença no mercado de trabalho e como chefe de família é cada vez maior. Produtos de aposentadoria, benefícios de seguro de vida pagos em vida (doenças graves), assessoria em proteção familiar, são conceitos que deverão emergir para atender esse novo nicho.

O grande desafio é criar produtos com recursos adequados e margens que sejam sustentáveis e compatíveis com a estratégia de distribuição da seguradora.

Consolidação, fusões e aquisições dos agentes de mercado

Por algum tempo, o tamanho parece ter sido visto, por muitas seguradoras, resseguradoras e corretoras de seguros, como um objetivo em si, trazendo com ele o poder de mercado e custos operacionais reduzidos. É lógico que o custo da nova tecnologia (investimentos) e a necessidade de economias de escala continuarão a impulsionar a consolidação dos agentes de mercado nos próximos anos. Essa é uma tendência que ocorreu nos últimos anos e deverá seguir nos próximos, ainda que num ritmo menor, entre esses agentes.

Outro desafio importante que as grandes seguradoras enfrentarão é o da especialização e do foco nas atividades essenciais (core business). O paradigma de crescer para obter uma melhor eficiência de custos e uma melhor eficiência operacional nunca foi tão válido, mas o novo pensamento também exigirá das companhias maior especialização.

Segundo diversos analistas de mercado, podemos esperar para os próximos anos mais terceirização de atividades não essenciais (não core) e um movimento de novas alianças estratégicas.

Distribuição e Internet

A digitalização e a Internet são hoje as principais fontes de eficiência e rentabilidade para seguradores e corretores de seguros, e essa tendência só deve se intensificar nos próximos anos. Para a maioria das seguradoras no Brasil, a prioridade para 2011 deve ser a utilização da Internet na otimização dos processos de negócios e, segundo, para melhorar e integrar os canais de atendimento existentes. Ela também poderá ser utilizada para apoiar o corretor de seguros em suas vendas de produtos muito simplificados (seguro viagem, acidentes pessoais e outros massificados).

Ao contrário da Europa e Estados Unidos, no Brasil as pessoas fazem negócios com pessoas. Diversas pesquisas indicam o Corretor de Seguros como canal de preferência do consumidor brasileiro, principalmente os consumidores da geração X, mesmo com todo o crescimento do comércio eletrônico no Brasil.

Os modelos de vendas serão mais consultivos e desenvolvidos com base na identificação e compreensão de necessidades dos clientes. Segundo pesquisas recentes, o atendimento diferenciado e a agilidade na resolução de problemas serão atributos cada vez mais valorizados pelo consumidor de seguros. O corretor precisará demonstrar um conhecimento amplo, estar à vontade com a tecnologia e ter acesso a um sólido suporte de vendas.

Regulamentação mais intensa

Nas principais economias do mundo, os órgãos reguladores planejam mudanças intensas na regulação e supervisão das seguradoras em geral. O foco estará em tornar mais transparentes os riscos assumidos por essas empresas. Ou seja, essa identificação não se aplica apenas ao risco da subscrição, mas também ao risco operacional, de crédito e de mercado da seguradora. Não há dúvida que a indústria de seguros será objeto de uma supervisão mais rígida, como vem ocorrendo nos últimos anos.

Outro desafio é o “Solvência II”, iniciativa de regulamentação que deve mudar a forma como as seguradoras vão gerir seus negócios. No entanto, também é provável que sejam estabelecidos maiores requisitos de capital, a exemplo do que está ocorrendo não só no Brasil, mas também em outros países, desde 2006.

Ao mesmo tempo, questões como comunicação e relacionamento com o consumidor serão revistas pela indústria, com o viés da simplificação da linguagem utilizada nos contratos e eliminação do “segurês”. O grande desafio é ter uma linguagem centrada no cliente e não no produto, como ocorrre hoje.

Em 2011 também podemos esperar mudanças no Código de Defesa do Consumidor. Questões como compras pela Internet e o endividamento do consumidor serão incluídas no Código.

As seguradoras deverão cada vez mais prestar atenção à governança corporativa, incluindo questões de privacidade do consumidor e conduta de mercado.

Produtos

O mercado de seguros de Vida amadureceu muito nesses últimos cinco anos em termos de produtos, mas, além da regulamentação e lançamento do microsseguro, há ainda muito espaço para avanços e melhorias em 2011 e 2012.

As mudanças introduzidas pelas resoluções CNSP 107 e 117 de 2004 e as circulares SUSEP 302 e 317, editadas em 2005 e 2006, respectivamente, também foram importantes para o amadurecimento do mercado, uma vez que propiciaram mais informação e transparência ao segurado em relação aos seus direitos e obrigações.

Outra questão importante foi a correção, nos últimos cinco anos, das distorções na carteira de vida em grupo, causadas pelas apólices antigas. Hoje o mercado utiliza critérios mais técnicos na subscrição e precificação dos riscos de Vida em Grupo, o que vem melhorando substancialmente o resultado dessas carteiras.

Com relação a novos produtos, ainda há uma série de riscos não atendidos e não cobertos pelo mercado segurador brasileiro. Riscos agravados (para pessoas que apresentam pré-existências), risco da dependência de longo prazo na velhice, capitais mais elevados, risco da descontinuidade de cobertura para apólices individuais, dentre os principais.

Com a abertura do mercado de Resseguro, as principais seguradoras deverão lançar novos produtos para atender esses riscos, até então não atendidos.

Seguros de Vida individuais com cobertura para toda a vida (vitalícios) resolvem o problema ou risco da descontinuidade da cobertura quando se mais precisa de proteção, por isso devem figurar como uma tendência para os próximos anos.

Ainda na linha dos produtos de longo prazo, algumas seguradoras deverão lançar em 2011 produtos temporários de 15 e 20 anos, com pagamento de prêmio nivelado durante o contrato.

As coberturas que pagam benefícios em vida também devem crescer, a exemplo dos mercados maduros e fruto de uma sociedade mais preocupada com os riscos e consequências de doenças como câncer, infartos e derrames.

Com relação aos produtos de acumulação financeira, podemos esperar duas novidades: o PrevEducação e o PrevSaúde, produtos destinados à acumulação de fundos para educação e saúde, respectivamente.

Nos seguros coletivos como “Vida em Grupo”, a grande novidade e tendência do mercado não estará no produto em si, mas em processos essenciais do negócio. Diversas seguradoras deverão disponibilizar ou aprimorar seus sistemas de faturamento e movimentação de segurados por meio da Internet, gerando mais conveniência e segurança no processo.

Análise e Aceitação de Riscos – Underwriting

Nos próximos anos, manter-se em dia com a tecnologia mais atual em termos de subscrição e análise de riscos será essencial para os seguradores brasileiros. Algumas companhias têm adotado sistemas automatizados que integram toda a cadeia produtiva do seguro de vida, até a entrega da apólice.

Um novo sistema deverá emergir, o que deve tirar do corretor de seguros a responsabilidade e o peso da declaração pessoal de saúde e risco (DPS). Esse processo será feito por um sistema de ‘tele-underwriting’ ou aceitação de riscos por telefone. Enquanto o cliente é entrevistado por telefone, suas respostas são transmitidas digitalmente para a área de emissão da seguradora, que armazena os dados ou efetua a transferência para um meio de subscrição automatizado. Nos casos sem histórico de saúde, isso pode significar a aprovação instantânea e uma apólice emitida de forma muito mais rápida.

Além do sistema de ‘tele-underwriting’, outra tendência na subscrição de riscos de Pessoas é a crescente utilização das redes sociais. Diversos estudos têm indicado que as seguradoras podem utilizar dados de redes sociais para ajudar na subscrição de riscos e na detecção de fraudes. Essas companhias deverão utilizar, cada vez mais, nos próximos anos, a informação recolhida a partir das redes sociais, incluindo Facebook, para aceitar, declinar ou agravar um proponente.

Canais múltiplos de atendimento

A Internet e os equipamentos digitais (celulares, iPads) vêm mudando a forma como as pessoas vivem, se relacionam, se portam e, literalmente, são hoje a grande responsável por uma mudança de comportamento.

Os consumidores cada vez estão online com seus celulares enquanto andam pelo shopping ou comem num restaurante. Ao mesmo tempo, o “iPhone” introduziu o conceito de downloads de aplicativos para tarefas e transações específicas. Neste ambiente, as seguradoras não podem mais pensar em ambiente online como um canal separado e distinto. O gerenciamento de multicanais é muito mais do que a Internet. Significa aprimorar a experiência do cliente e dos corretores de seguros, além de otimizar os custos operacionais da seguradora.

As seguradoras terão o desafio de aumentar seu poder de reação e resposta, suportado por esses diversos canais de atendimento. Tal ambiente exigirá que a companhia implemente processos que se reforcem mutuamente e, ao mesmo tempo, seja ágil o suficiente para reagir às mudanças contínuas.

Samy Hazan
Superintendente de Planejamento e Vida da Marítima Seguros. Formado em Administração de Empresas pela Fundação Getúlio Vargas (FGV-SP), é especialista em Marketing e Distribuição pela Université Catholique de Louvain. É professor dos cursos de MBA em Seguros da FGV-SP e Fundação Instituto de Administração da Universidade de São Paulo (FIA-USP)
samy@maritima.com.br

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