Breaking News

Conversa de Seguro por José Luís S. Ferreira da Silva

Fonte: CQCS | Conversando sobre seguro

Caros leitores e leitoras do CQCS, Como convidado para a coluna começo hoje a primeira agradecendo e iniciando do que poderia ser o básico: como é que a seguradora chega ao preço de um seguro ? Muitos já devem ter ouvido falar que as taxas são calculadas por uma tal "Estatística" (ou Atuária ou ainda Ciência Atuarial) que analisa os sinistros ocorridos e, a partir da quantidade e custos destes, calcula a chance do sinistro futuro acontecer chegando a um preço (prêmio) a ser pago por quem quer segurar vida ou patrimônio.

Hoje existem modelos de previsão estatística bastante sofisticados e as seguradoras conseguem chegar a prêmios que preveem, com pouca margem de erro, a frequência e custo médio de sinistros de um grupo de segurados antes de as vigências começarem. Mas se a mãe da estatística é a matemática e dois mais dois sempre são quatro, como é que as seguradoras têm preços tão diferentes umas das outras ? Bom ... agora complicou. Você vai ter que entender como se faz o cálculo do prêmio mas sem detalhes técnicos por pedagogia.

Vamos utilizar como exemplo o automóvel, afinal é o produto mais vendido pelos corretores. Uma seguradora tem uma certa quantidade de veículos segurados de marca, modelo, ano, perfil e região parecidos (a analise só é válida se a amostra for composta de itens similares e em quantidade). Alguns em começo, outros no meio e outros ainda no fim de vigência. A primeira coisa que ela precisa fazer para analisar esta amostra de veículos é unificar o tempo de exposição a sinistros de todas as apólices vigentes a 12 meses (estatísticas geralmente compreendem um período de 12 meses de sinistros ocorridos ) através do cálculo do período decorrido de cada apólice em dias.

Eu sei, difícil entender. Para facilitar: vamos pensar em dois veículos segurados idênticos, um com seis meses e o outro com quatro meses de vigência transcorrida, você tem no primeiro uma exposição de meio veículo (seis meses é a metade de um ano) e no outro de 1/3 de veículo (quatro meses é 1/3 ou 0,33 de um ano). O primeiro meio veículo (0,5) mais o segundo um terço de veículo (0,33) dá uma exposição de 0,833 veículo. Curioso mas frota segurada é sempre uma quantidade inteira (você tem dois veículos na frota) mas frota exposta para cálculo do seguro é uma fração graças as diferentes vigências decorridas (já imaginou o sistema que a seguradoras possuem para calcular as exposições das suas frotas seguradas ?). Mas dois veículos é pouco.

Se a análise fosse de uma frota de oitocentos veículos, olhando a vigência decorrida um por um, você talvez chegasse a um número estranho como 433,35 veículos expostos. Reitero: este número refletiria a soma do tempo de vigência do seguro de cada veículo até o momento da analise da sinistralidade que se deseja fazer. Agora que você já sabe a diferença entre frota segurada e frota exposta, vamos usar os 433,35 veículos como exemplo do que ocorreu nas vigências decorridas e quanto isto custou.

Digamos que nas vigências até este momento 12 veículos foram furtados (quando o veículo desaparece), roubados (quando existe violência contra o condutor ou responsável e o veículo é levado) ou foram vitimados por perdas totais por colisão e a seguradora indenizou em R$ 22.000,00 em média em cada. E digamos que 58 se envolveram em colisões e a seguradora pagou uma média de R$ 3.300,00 em cada (já descontada a franquia).

Quanto a seguradora indenizou nesta exposição de 433,35 veículos? 12 furto/roubos/PT's multiplicados por R$ 22.000,00 cada veículo = R$ 264.000,00 58 colisões parciais multiplicados por R$ 3.300,00 cada reparo de veículo = R$ 191.400,00. A soma dos gastos com sinistros = R$ 455.400,00 Se o gasto com sinistro foi de R$ 455.400,00 e exposição é de 433,35 veículos, cada segurado teria que pagar R$ 1.050,88 para que a seguradora tivesse dinheiro para indenizar os sinistros (divida os R$ 455.400,00 indenizados para cada um dos 433,35 veículos expostos e chegará nos R$ 1.050,88). Este é o prêmio de risco.

Fala a verdade, fora talvêz aquela parte da exposição, não foi tão difícil. Só que se a seguradora cobrar de todos os segurados destes veículos (e agora tem que ser da frota já que a exposição é só para o cálculo) só R$ 1.050,88, como é que ela paga as suas despesas de funcionamento, a comissão dos seus corretores e o lucro dos acionistas (que esperam mais lucro do que o que obteriam em uma aplicação senão eles venderiam a seguradora e colocariam o dinheiro no banco, ganhando mais sem ter que se preocupar com os riscos do negócio)? Simples: carregue a despesa administrativa, digamos 20%, sobre os R$ 1.050,88 e terá R$ 1.313,50. Depois carregue a comissão que vai pagar ao corretor, digamos 25% e chegará a R$ 1.751,47.

Com o carregamento da expectativa de lucro dos acionistas vamos arredondar para uns R$ 1.800,00 de prêmio líquido casco. Se você entendeu como chegamos neste número, então já sabe calcular um seguro. Para o RCF, APP e a maioria dos ramos de seguros é a mesma lógica. E, ressalvo, o que foi lido é um exemplo de cálculo bem simplificado pois não falamos de salvados, ressarcimento, custo de apólice, reservas e resultados financeiros, etc, etc.

Voltamos a pergunta que te obrigou a entender isto: por que então as seguradoras tem preços tão diferentes? Primeiro: exposições desiguais. Dentro da história de cada seguradora elas acabaram atraindo segurados de diferentes regiões, perfis, marcas, anos e modelos de veículos. Ou seja: elas tem amostras expostas desiguais e muitas sem significância estatística para fazer a taxação (número de itens expostos pequeno naquela célula de idênticos perfil, região, veículo para poder fazer o cálculo correto do prêmio). Então elas acabando juntando alguns perfis e regiões para conseguir amostras com maior grau de significância estatística e, como umas tem mais perfis de um tipo que outras, presenças diferentes em cada região ou atraíram mais ou menos certas marcas de veículos, os preços começam a ficar diferentes já que as exposições analisadas são diferentes.

Lembre-se de que achar muitos itens idênticos para taxar com tamanha variedade de marca, ano, modelo de veículos, perfis de segurado e regiões exige uma frota muito grande e bem distribuída, o que é difícil num país do tamanho do Brasil. Segundo: competência na gestão das indenizações. Indenizar bem não é pagar nem mais nem menos, é pagar o correto.

Se a seguradora não acompanha seus custos de sinistro da forma devida tende a pagar mais do que o correto e isto aumenta os gastos com sinistros que acabam indo parar nos prêmios, como demonstrado. Terceiro: modelo estatístico. A forma de fazer estes cálculos foi a básica. Mas existe uma complexidade que depende de investimento tecnológico, dos modelos estatísticos e de coleta de dados e da experiência acumulada de cada seguradora em taxar. Isto diferencia o resultado final das analises das exposições de veículos. Quarto: velocidade.

Algumas seguradoras fazem os lançamentos dos sinistros muito rapidamente no seu sistema e outras com mais vagar. Se a sinistralidade aumenta as primeiras repassam ao preço mais rápido que as segundas. Se a sinistralidade cair idem. Hoje assistimos a um aumento grande da sinistralidade de roubo de veículos que surpreendeu as taxações e está exigindo correções de preços. Fazer uma tarifa é estimar o caminho a frente olhando pelo retrovisor, podem haver surpresas quando ocorrem mudanças sociais muito rápidas.

Espero que este texto dismistifique a imagem de que a seguradoras aumentam ou diminuem preços com base no que leem nos jornais. O cálculo tarifário é todo com base na experiência da frota exposta de cada seguradora e é feito por sofisticados meios eletrônicos. Quinto: carregamento da despesas administrativa.

Algumas têm despesas administrativas menores pois definiram que venderiam produtos mais enxutos, sem tantos benefícios ou com atendimento simplificado. Outras despesas maiores pois optaram por benefícios, serviços e atendimentos de maior complexidade. E, claro, vai aqui a competência de gestão de cada uma em oferecer o máximo gastando internamente o mínimo. Quem gasta menos e oferece mais, carrega menos e fica mais competitivo. Sexto: carregamento da comissão: quem paga mais carrega mais, quem paga menos carrega menos.

Portanto que se fixe um conceito: quem paga a comissão não é a seguradora é o segurado. A seguradora apenas repassa a comissão embutida no prêmio que cobrou e zela para que carregamentos elevados não tirem sua competitividade de preços e, portanto, diminuam as vendas. Sétimo: política de subscrição (nome do processo de tomada de decisão seletiva de riscos). As segurados tem políticas de aceitação diferentes e, portanto, concentram exposições diferentes. Se você é do ramo de seguros provavelmente já deve estar trazendo para a sua realidade alguns destes conceitos.

E, se chegou até aqui, entendeu o que é taxação por "competência de risco". Agradeço a atenção, espero que este texto lhe tenha sido útil.

Obrigado e até o próximo. José Luís S. Ferreira da Silva jose.luis@portoseguro.com.br

CURRÍCULO:

José Luís S. Ferreira da Silva
jose.luis@portoseguro.com.br

Formado em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, pós-graduado em Administração de Empresa pela Faculdade Getúlio e MBA Executivo de Seguros IBMEC/Funenseg.

Iniciou sua carreira em seguros em 1985. É diretor estatutário da Porto Seguro Seguros há 11 anos e responde pelas sucursais do Norte/Nordeste/Centro-Oeste/MG/ES e RJ, pela Porto Seguro Proteção e Monitoramento, pelo produto Transportes, pela Portoserv (serviços a condomínio) e pela Produção Diferenciada (Licitações, Cooperativas e Massificados). Membro da Comissão Intersindical (Sindseg SP/Sincor SP) foi palestrante de congressos e encontros de corretores de seguros nos últimos quinze anos.

As opiniões deste colunistas não expressam necessariamente as opiniões da Porto Seguro Seguros S.A.

Nenhum comentário

Escreva aqui seu comentario