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R$ 3 bi para falsos seguros

Fonte: Estado de Minas

Associações irregulares já movimentam 15% do valor arrecadado pela proteção de veículos do mercado formal. Susep, Polícia Federal e Ministério Público investigam 20 empresas

Marinella Castro e Pedro Rocha Franco

As associações e cooperativas que nasceram em Minas Gerais para comercializar a chamada proteção automotiva, uma espécie de seguro veicular para carros e caminhões, estão se alastrando pelo país. Partindo de Minas, as organizações criaram braços e proliferaram em estados do Sul e Sudeste, faturando alto no espaço que antes era reservado ao mercado oficial. Cálculos do setor de seguros dão conta de que no ano passado o mercado paralelo movimentou R$ 3 bilhões, que deveriam ser direcionados às empresas formais. Os falsos seguros deixaram de ser negócio pequeno para movimentar volume que já corresponde a cerca de 15% dos prêmios arrecadados em 2011 no segmento de automóveis.

No país está em curso uma briga bilionária envolvendo órgãos oficiais e as associações de proteção veicular, sob pressão do mercado oficial. Estimativas do setor de seguros já apontam para 500 mil veículos ligados ao segmento que aumenta sua operação no país, sem aval do órgão regulador. Na prática, um grupo de pessoas forma uma associação e a partir daí começa a capturar associados. O produto é chamado de falso porque é vendido sem permissão da agência reguladora. O comércio não tem regulação ou intervenção do Estado, como no mercado formal. Em um ambiente sem reservas técnicas, também não há como garantir que as organizações conseguirão pagar suas indenizações. Como a cobrança ocorre na forma de rateio, ou seja, o prejuízo é dissolvido por todos os associados, é difícil prever quanto o seguro custará ao término de um ano. Algumas associações estão formando filas para o rateio: em caso de acidente o segurado é obrigado a esperar meses para ter o veículo consertado.

A Superintendência de Seguros Privados (Susep), Polícia Federal (PF) e Ministério Público Federal (MPF) operam em uma força-tarefa por meio da qual investigam a ação de cerca de 20 associações, além de ações civis públicas e criminais que tramitam na Justiça. Do outro lado, para fazer frente à fiscalização e defender o território ocupado, as associações brigam na Justiça, mudam de endereço e multiplicam CNPJs. Luciano Santanna, superintendente da Susep, aponta que associações da Grande BH foram identificadas mantendo filiais na região dos lagos e em alguns bairros da capital do Rio de Janeiro.

Neival Freitas, diretor-executivo da Federação Nacional de Seguros Gerais (Fenseg), diz que o setor entrou na briga, denunciando a prática, dando suporte a ações civis públicas e criminais. "O valor que se estima de desvios chega perto de 15% dos prêmios do mercado de seguros", reforça. A reportagem procurou o MPF. O órgão preferiu não se pronunciar, informando que as investigações estão em curso.

Há dois anos, o transportador João Luiz Amorim tombou sua van na BR-040. Como de praxe, ele registrou o boletim de ocorrência e acionou o falso seguro. Depois disso, encaminhou o veículo para a oficina, mas a Associação do Corpo de Bombeiros Militar de Minas Gerais (Ascobom) não aceitou os parâmetros do orçamento e foi sugerido que João procurasse outra mecânica. O reparo seria pago em duas prestações. Entre as divergências, o entendimento do transportador era que o acidente havia resultado em perda total, enquanto a credenciada considerava ser possível recuperar a van. As condições não foram aceitas e João Luiz se viu obrigado a entrar na Justiça. Para piorar, ele teve que arcar com o conserto de R$ 3 mil do caminhão envolvido no acidente.

Depois de pagar regularmente o "seguro", o administrador de empresas Bruno Catta Preta Pereira teve o carro roubado em fevereiro. A empresa pediu 30 dias para encontrá-lo, caso contrário pagaria imediatamente. Mas, em abril, ele ficou sabendo que só receberá em setembro. "Disseram que tenho que entrar na fila do rateio. E não tenho outra saída. Se entro na Justiça, pode ser que demore mais.", afirmou. Nas associações , além do rateio (valores dividido pelo grupo) que faz o associado perder o controle dos valores do seguro, não há garantias de que a empresa terá solvência para quitar as indenizações devidas, uma vez que não existe fiscalização ou reserva técnica. O Estado de Minas entrou em contato com a Ascobom, mas até o fechamento da edição não teve retorno.

Passo a passo

Veja como funciona o esquema

Um grupo de pessoas decide se unir, formando a chamada ação entre amigos. Com o formato de uma associação ou cooperativa, vendem proteção automotiva sem autorização da Superintendência de Seguros Privados (Susep).

Ao assinar o contrato, o cliente passa a ser um associado, uma espécie de dono da empresa. Não é um consumidor.

Os prejuízos dos acidentes são rateados entre os associados.

O cliente não tem controle de quanto pagará de seguro ao término de um ano, devido à política de rateios.

Como não existe a reserva técnica ou fiscalização para garantir a solvência, o usuário não tem garantia de que a associação terá como arcar com as indenizações.

Em caso de problemas, o órgão acionado deve ser o Judiciário. Os Procons não atuam no setor.

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