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Vida milionária

Fonte: IstoÉ Dinheiro

Clientes interessados em seguros acima de R$ 2 milhões não precisam mais comprar apólices fora do País.

Por Patricia ALVES e Tatiana BAUTZER

A dona de casa Mariana Naves nunca conseguiu receber a indenização de R$ 1,2 milhão prevista na apólice do seguro de vida comprado por seu marido. A viúva tenta receber da seguradora americana National Western Life, sediada em Austin, no Estado americano do Texas, desde 2004. Desde que o empresário Antonio Manoel Rodriguez, sócio de uma concessionária de veículos, morreu assassinado, ela já recorreu aos tribunais brasileiros e americanos. Sem sucesso. No Brasil, a seguradora não apresentou advogado no processo pedindo a indenização e foi condenada a pagar. Quando tentaram executar a sentença nos Estados Unidos, os advogados foram derrotados porque a lei do Texas estabelece que condenações no Exterior só valem se a empresa apresentou defesa no processo.

Dirceu Braga, da Mongeral: produtos diferenciados atraem público de alta renda
e podem alavancar setor de seguros no Brasil.

“Foi um processo desgastante e muito injusto, essa senhora ficou sem meios de sobrevivência”, afirma um dos advogados que atuou nesse caso. Foi o prejuízo da segurada que levou a Superintendência de Seguros Privados (Susep) a multar a National Western em R$ 11 bilhões por ter vendido mais de 20 mil apólices ilegalmente no Brasil. O valor da multa equivale ao total segurado pela National Western e até agora não foi pago — a seguradora está recorrendo. A Susep investiga outras 15 empresas que atuam por meio de corretores independentes. A história de dona Mariana revela o aspecto mais dramático de um problema comum a altos executivos e empresários brasileiros: como garantir que sua família mantenha seu padrão de vida em caso de um acidente ou doença grave, usando seguros de vida. Segundo o IBGE, 200 mil famílias brasileiras têm renda anual superior a R$ 1,5 milhão.

Estima-se que eles movimentem R$ 60 milhões em prêmios de seguros a cada ano. Uma pesquisa da Tax Justice Network revela que os brasileiros são titulares, em contas em paraísos fiscais, de US$ 520 bilhões – o quarto maior volume entre milionários de 139 nacionalidades, atrás de chineses, russos e coreanos. Até a década de 1990, com a instabilidade econômica e altas taxas de inflação, era praticamente impossível contratar um seguro de longo prazo no País. A situação não foi resolvida mesmo com a estabilidade trazida pelo Plano Real: produtos começaram a ser oferecidos, mas o custo de contratar uma apólice com indenização de R$ 5 milhões, por exemplo, era proibitivo. O cenário mudou no último ano. Três empresas já vendem apólices com capitais segurados entre R$ 2 milhões e R$ 10 milhões a preços razoáveis: Prudential, Mongeral Aegon e Mapfre.

Maristela Gorayb, da Mapfre: "Muitas empresas estão se interessando pelo produto
como um benefício para seus funcionários".

CENÁRIO. Um dos grandes problemas que as seguradoras tinham para vender apólices de vida de alto valor era a dificuldade para dividir o risco da cobertura por meio de resseguro. Até 2008, o segmento era monopolizado pelo estatal Instituto de Resseguro do Brasil (IRB). A saída mais comum, então, era seguir o exemplo do marido de dona Mariana e contratar seguros no Exterior, principalmente nos Estados Unidos. As apólices eram compradas aqui, de consultores independentes, treinados nos moldes internacionais e que agiam em nome de seguradoras estrangeiras. Com isso, esse mercado floresceu numa zona cinzenta, já que não existia regulamentação sobre o assunto. O cenário mudou em 2007, quando a lei 126 tornou ilegal comprar seguros lá fora se houver produto similar no mercado nacional.

A proibição reduziu um pouco a demanda, mas o mercado de apólices estrangeiras continuou ativo no Brasil. Segundo um corretor, os clientes compravam porque havia muito mais oferta no mercado internacional, e a preços melhores. “Faltavam produtos no Brasil e o custo era muito alto para seguros acima de R$ 1 milhão”, diz o corretor. O grande problema de comprar apólices de uma empresa sem representação no País é que o segurado fica desamparado se a indenização for negada. A demanda pelas apólices milionárias está surpreendendo as seguradoras. Em um ano, a Mongeral Aegon já tem 150 clientes, atingindo um capital segurado total de R$ 277 milhões. A Mapfre, em apenas seis meses, tem 500 clientes com valor segurado médio de R$ 1 milhão.

Fernando Pinto, da Prudential: pioneiro no segmento de alta renda,
oferece apólice de até R$ 15 milhões.

Segundo a diretora de Previdência e Vida Resgatável da Mapfre Previdência, Maristela Gorayb, as metas para um ano foram atingidas em poucos meses. “Muitas empresas estão usando o produto como um benefício para seus funcionários”, afirma Maristela. A Prudential, pioneira nesse mercado no Brasil, oferece capital segurado de até R$ 15 milhões. Para o vice-presidente da Prudential, Fernando Pinto, a concorrência é bem-vinda. “O mercado de seguros de vida ainda é muito pequeno no Brasil, comparado com o restante do mundo”, afirma. As opções estão cada vez mais sofisticadas. É possível contratar o seguro de vida por um período determinado, de dez ou 20 anos, apenas para fazer face a uma despesa específica, como a quitação de um financiamento imobiliário ou o pagamento da educação de um filho.

Nesses casos, o preço é bem palatável. Um cliente de 45 anos que queira segurar R$ 2 milhões por 20 anos pagaria, por exemplo, R$ 6.600 anuais à Mongeral e R$ 9.200 à Mapfre. Outra alternativa é o seguro de vida resgatável, no qual parte do prêmio é investida e devolvida ao segurado depois de um certo prazo. Esse tipo de seguro pode ser usado como instrumento para constituir uma reserva previdenciária, principalmente para clientes que não têm disciplina para poupar sozinhos. Há ainda a alternativa de deixar uma herança para um beneficiário específico, como o filho de um segundo casamento ou um parente distante. “O seguro com essa finalidade tem a vantagem de não entrar no inventário e não pagar imposto sobre transmissão de bens”, afirma o superintendente da Mongeral, Dirceu Braga.


Aí, os prêmios são mais altos e variam de acordo com o percentual e condições da parcela resgatável, podendo superar R$ 150 mil em valores segurados próximos de R$ 10 milhões. Há, ainda, apólices que podem ser utilizadas para planejamento sucessório ou reduzir riscos em empresas. Numa companhia com vários sócios, a seguradora garante que não haja mudanças repentinas no grupo controlador. Caso um dos sócios morra, a seguradora paga uma indenização para que os outros comprem sua parte dos herdeiros. “São produtos usuais no Exterior, que podem mudar radicalmente o planejamento financeiro no Brasil”, afirma Braga. É possível, também, reduzir o risco para o negócio de uma empresa média se um executivo-chave morrer. Há um seguro para cobrir a contratação de um profissional equivalente no mercado. Mesmo com capitais limitados a R$ 10 milhões, o mercado para apólices empresariais é grande.

“Cerca de 80% das empresas brasileiras são médias”, diz o superintendente da Mongeral. Além disso, sistemas sofisticados de precificação de risco permitem vender apólices a pessoas que não conseguiam ter cobertura de vida, como obesos, fumantes, cardíacos ou diabéticos. “Tudo tem um preço, mas conseguimos oferecer os seguros”, diz Maristela, da Mapfre. Além das condições físicas, o estilo de vida do segurado, como a prática de esportes de risco, também influi no valor dos prêmios. Com produtos diferenciados, o mercado brasileiro pode recuperar o atraso da penetração dos seguros de vida, que hoje é de apenas 1,4% do PIB, ante 9,5% nos Estados Unidos. “A queda da taxa de juros trará uma revolução no planejamento financeiro no Brasil”, afirma Braga.

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