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Desprotegidos

Fonte: Valor Econômico

Por Luciana del Caro | Para o Valor, de São Paulo
 
Zanzini diz que seguro de vida deve ser visto como suporte para família se reestruturar após a morte do provedor.

O mercado de seguros de vida vem crescendo cerca de 10% ao ano, impulsionado pelo aumento do emprego formal, da renda disponível e da inclusão do produto em acordos coletivos. Apesar dessa expansão, o seguro de vida ainda é mal compreendido pela maioria. E poucos chefes de família pensam na necessidade de amparar financeiramente os dependentes em caso de morte. A consciência de que os seguros de vida e de invalidez são parte importante do planejamento financeiro ainda não é generalizada.

"Muitas pessoas imaginam que o seguro é algo que irá resolver definitivamente a vida da família, em vez de enxergá-lo como uma forma de garantir a sobrevivência enquanto a família se reequilibra financeiramente após a morte do provedor", afirma Bento Zanzini, diretor geral de seguros de pessoas do Grupo Segurador Banco do Brasil e Mapfre. Embora essa percepção esteja mudando à medida que melhora a educação financeira da população, a ideia de que seguro de vida é apenas uma herança frequentemente leva as pessoas a contratar proteções inadequadas, a considerar os prêmios elevados demais - daí a fama de ser um seguro caro - e até a descartá-lo.

O seguro de vida deve ser visto como um instrumento para suprir as necessidades da família após o falecimento de seu principal provedor, dizem os planejadores financeiros. Ele não é uma ponte para a riqueza. A fase em que as pessoas mais precisam de proteção é a de acumulação de recursos, quando a carreira está em ascensão e os filhos ainda são menores de idade.

Um estudo da Swiss Re divulgado nesta semana mostra que os brasileiros tinham em 2012 uma "lacuna de proteção em caso de morte do provedor" de US$ 2,5 trilhões. Esse é o volume de recursos necessário para os dependentes manterem o mesmo nível de vida e representa um crescimento médio de 15% ao ano desde 2003, quando a lacuna estava em US$ 685 bilhões. Em 2012, a lacuna média de recursos por pessoa com dependentes no Brasil era de US$ 47.239, o que significa que, para cada US$ 100 de proteção necessária, as famílias brasileiras tinham US$ 50 em ativos financeiros e seguro de vida.

Para contratar a cobertura de um capital suficiente para atravessar um período de reequilíbrio das finanças não são necessários cálculos complexos. De acordo com o planejador financeiro Jean Michel Lartigue, o primeiro passo é levantar os gastos mensais e anuais da família. Depois, define-se por quanto tempo ela precisará dos recursos. Esse horizonte é dado pelos anos de estudo que os filhos ainda têm pela frente. Multiplicando-se os dois, chega-se ao valor bruto de necessidade de proteção.

No entanto, esse capital pode ser bem elevado e até superavaliado, o que implica pagamento muito alto. O prêmio de um plano tradicional para um capital segurado de R$ 1 milhão, por exemplo, pode chegar a R$ 3 mil mensais - o que inclui cobertura contra morte (natural e acidental) e invalidez (por doença e acidente) de um homem de 55 anos. Claro que a idade, a profissão e o estado de saúde influenciam muito no valor dos prêmios porque estão relacionados ao risco transferido para a seguradora. O prêmio de um seguro para um homem de 30 anos com capital segurado de R$ 100 mil gira em torno de R$ 25 mensais.

Outro fator que acaba inflando os prêmios, diz o corretor Celso Santolin, é a própria comissão dos corretores: ela varia de 10% a 40% e tende a ser maior nos produtos vendidos nas agências bancárias. Por isso, há vários aspectos que devem ser levados em conta para minimizar os custos do seguro.

O patrimônio que a família acumulou e sua capacidade de gerar renda é um deles. Devem ser considerados apenas os recursos líquidos (excluindo os imóveis). A existência de uma pensão por parte do Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS), caso o provedor tenha contribuído, o recebimento de aluguéis e eventual salário do cônjuge precisam entrar no cálculo, diz Annalisa Dal Zotto, planejadora financeira certificada.

Levando em conta essas receitas, a necessidade de proteção diminui - e o prêmio também, já que o capital segurado será menor. A planejadora diz que, no caso de invalidez, o capital segurado deve ser maior porque o beneficiário também terá de sustentar a si mesmo e provavelmente terá aumento de despesas com saúde. Na maioria dos produtos, o seguro contra invalidez permanente é oferecido junto ao seguro de vida. Vale pesquisar o que se considera invalidez total e parcial, de forma a assegurar-se que a cobertura é adequada para as necessidades de cada um.

A existência de algum outro seguro, de grupo, por exemplo, também precisa ser analisada na hora de estipular o capital que precisa ser protegido no seguro individual. Este pode ser utilizado apenas para complementar o plano em grupo. Os seguros oferecidos pelas empresas a seus funcionários geralmente cobrem de 12 a 36 vezes o salário, diz Eduardo Marchiori, diretor da Mercer Marsh Benefícios. Mas ele só é válido enquanto o funcionário estiver empregado. Portanto, a complementação com o seguro individual pode ser necessária não só pelo capital, mas também porque ele independe do vínculo empregatício.

A ideia é que o recebimento do seguro seja um apoio até mesmo para famílias com um bom patrimônio, por conta da liquidez. Os inventários costumam demorar alguns meses, frequentemente mais de um ano, e os herdeiros precisam pagar Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD), que na maioria dos estados é de 4% do patrimônio, e os custos dos advogados - conta que pode chegar a 14% do patrimônio. Como os recursos do seguro não entram no inventário, seus beneficiários os recebem pouco tempo após o falecimento do titular (cerca de um mês) e podem utilizá-los para pagar os custos do inventário. Além disso, os recursos não são tributados. Por isso, Lartigue diz que o seguro também pode ser útil como planejamento sucessório.

Essa característica do seguro não o torna necessariamente dispensável para quem já tem planos de previdência como o VGBL (Vida Gerador de Benefícios Livre), cujos recursos também não entram em inventário: "No começo da carreira, o VGBL é complementar ao seguro de vida. Os dois precisam estar juntos porque a pessoa pode morrer antes de ter acumulado recursos significativos na previdência privada", diz Julio Medina, superintendente de investimentos da seguradora MetLife.

Como o tema é considerado desagradável para a maioria das pessoas - daí a pouca reflexão sobre a necessidade de proteção -, as seguradoras vêm oferecendo serviços que podem ser usufruídos em vida. "Falar sobre a possibilidade de morte ainda é algo que assusta as pessoas. Ao oferecermos serviços tangíveis vinculados ao seguro de vida, aumentamos o valor agregado dos produtos", diz Marcio Magnaboschi, diretor de vida e previdência da SulAmérica. Um exemplo é um seguro de vida voltado para mulheres, o SulAmérica Você Mulher, que oferece uma segunda opinião médica internacional em casos de doenças graves, assistência nutricional e para atividades físicas, baby sitter e transporte escolar para os filhos das seguradas, em caso de sinistro, e serviços como o de chaveiro e eletricista.

Outro tipo de produto que acena com algum usufruto em vida e vem crescendo é o seguro resgatável. No seguro comum, todo o prêmio é perdido se o segurado não morrer ou ficar inválido. Já no resgatável, uma parte do prêmio vai para a cobertura do seguro de vida e outra vai para um fundo de investimento gerenciado pela instituição financeira em que se contratou o seguro. Após algum tempo - ou mesmo em caso de doenças graves, em alguns produtos - é possível resgatar esse dinheiro se não ocorreu o sinistro (ou seja, se o segurado não faleceu ou ficou inválido).

Há, no entanto, várias cláusulas que limitam e penalizam o saque dessa parcela de recursos que ficou rendendo. Em algumas seguradoras, caso o segurado opte por resgatar os recursos antes de dez anos, pode sacar apenas 50% do valor acumulado em sua reserva por sobrevivência. Por isso, esse tipo de produto não é um consenso entre os especialistas.

Alguns consideram que ele pode ser interessante, mas desde que realmente os recursos fiquem no longo prazo: "Os seguros resgatáveis cumprem duas funções: a proteção e a formação de um saldo que pode ser revertido para o segurado", diz Lartigue. Para ele, a alternativa é muito atraente para quem realmente não pretende sacar os recursos antes dos prazos e também dispõe de caixa para bancar os prêmios mais elevados desse tipo de seguro.

Aliás, estes são bem mais salgados que os seguros comuns: podem custar até cinco vezes mais. Além disso, a seguradora cobra uma taxa de administração para gerenciar os recursos, e estes rendem menos que fundos de investimento conservadores: "Os recursos costumam ser mal remunerados e os produtos são cheios de regras complicadas", afirma Annalisa Dal Zotto. Portanto, ela considera mais interessante aplicar recursos adicionais em planos de previdência, que contam com benefícios tributários e tendem a apresentar rendimentos superiores aos do seguro resgatável.
 

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