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Lava-Jato provoca mudanças no D&O

Fonte: Valor Econômico
Por Denise Bueno

Alívio. Esse é o sentimento dos principais executivos que atuam com o seguro de responsabilidade civil de executivos, conhecido como Directors & Officers (D&O).

Com a Lava-Jato, o seguro foi redesenhado pela Superintendência de Seguros Privados (Susep), mas a circular 541, de outubro do ano passado, impôs modificações que tornaram o produto desinteressante para clientes e seguradoras, além de deixarem muitas dúvidas nas entrelinhas.

Depois de muitas reuniões, das quais participaram, além dos players do mercado, instituições como Comissão de Valores Mobiliários (CVM), Associação Brasileira das Companhias Abertas (Abrasca) e Ordem dos Advogados (OAB), a Susep entendeu que seria necessário discutir melhor as mudanças. No dia 24 de fevereiro publicou a circular 546/17, que suspendeu por 90 dias, prorrogáveis por mais 90, as mudanças anteriormente exigidas. "Entendemos que era necessário rediscutir alguns tópicos", comentou o xerife do mercado, Joaquim Mendanha, titular da Susep.


"Foi um grande alívio para todos. Tínhamos muitas dúvidas e em razão disso várias companhias ainda não estavam preparadas para atuar com as novas determinações que passariam a valer em março", disse Gustavo Galrão, diretor da Argo Seguros e coordenador da Comissão de Linhas Financeiras da Federação Nacional de Seguros Privados (FenSeg).

Até então, o que prevalecia no mercado era uma apólice na base "all-risks". Isso significa que tudo aquilo que não está descrito explicitamente no contrato como coberturas excluídas ou ações excluídas é passível de cobertura. Só que com a explosão das denúncias da Lava-Jato e a recessão da economia, tudo começou a ser questionado, e a Susep passou a apólice de "all risks" para "riscos nomeados", determinando as coberturas.

"As mudanças eram necessárias por conta do crescimento do mercado, das novas leis de penalização dos administradores e a amplitude das empresas seguradas. A Lava-Jato só agilizou os ajustes das regras, aumentou a demanda pelo produto ao trazer mais consciência da exposição dos administradores aos riscos de uma economia em baixa e elevou os investimentos das empresas em compliance", comenta Henrique Beloch sócio da área societária do BMA Barbosa, Müssnich, Aragão.

As seguradoras passaram a exigir um cuidado maior na avaliação de riscos relacionados com corrupção e riscos ligados a essa tema, como lavagem de dinheiro, crime contra a administração pública, entre outros, explica Fernando Saccon, líder de linhas financeiras da Zurich. "As companhias de seguros e de resseguros passaram a exigir uma maior clareza no que se refere às suas políticas de transparência, controles internos e compliance, que inclui a forma de relacionamento com empresas, fornecedores, especialmente com o governo", afirma.

Entre os pontos positivos das mudanças da Susep, que tem a função de proteger o consumidor, Galrão cita o fato de a autarquia deixar claro que o produto cobre multas expedidas por órgãos reguladores, desde que não seja comprovado ato doloso no processo. "Essa era uma demanda dos clientes e agora ficou permitida a cobertura", informa.

Demanda aumentou com despertar de consciência da exposição dos gestores aos riscos envolvidos

Um dos pontos mais polêmicos foi tirar a cobertura de custas judiciais do produto principal, que visa proteger o patrimônio do executivo acionado por causar prejuízos involuntários à própria empresa, a acionistas e a terceiros em geral. Isso esvaziou o produto, uma vez que praticamente 90% do uso deste tipo de seguro é o pagamento de honorários para a defesa do executivo. Se absolvido, além das custas, a seguradora paga o valor da sentença aplicada. Se condenado, tem de devolver o valor adiantado pela seguradora. Vale lembrar que o seguro não cobre atos dolosos e quem fez delação premiada perde o direito à cobertura.

Se a separação entre cobertura de proteção do patrimônio e custas de defesa prevalecer, terá de ser desenvolvido um novo modelo de precificação, dizem as fontes. Além disso, prejudicará os fundos de pensão, que têm uma norma, a Resolução CGPC 13/2004, que diz que as instituições só podem comprar esse seguro para cobrir as despesas de custeio de defesa na esfera administrativa, caso de uma autuação da Previc, em processos iniciados por CVM, Ministério Público ou por participantes, na esfera judicial, que venham a se sentir prejudicados pela gestão do fundo. Caso a patrocinadora do fundo pague o seguro, a cobertura pode ser mais abrangente.

Uma dúvida levantada pelo grupo da FenSeg é se na nova norma a cobertura do D&O abrange operações fora do Brasil, indenizando cobertura de custas e decisões judiciais por ações movidas no exterior. Afinal, empresas com ações na bolsa dos Estados Unidos e as globalizadas são as principais clientes deste produto. "A circular fez restrição à menção a leis estrangeiras, o que possivelmente pode afetar a cobertura mundial para empresas com operações fora do Brasil", observa Flávio Sá, gerente de linhas financeiras da AIG Brasil.

Mauricio Bandeira, gerente de produtos financeiros da Aon Brasil, cita o fato de outras mudanças, como a cobertura para dano ambiental e para erros e omissões estarem proibidas. "Ainda deverá ser esclarecido pela Susep a questão da cobertura secundária praticada nas apólices em vigor", cita o corretor, acrescentando que a nova circular não menciona cobertura para valores mobiliários, cobertura C, condição relevante para empresas de capital aberto e expostas ao mercado de valores mobiliários local e internacional.

Ainda não se sabe o que será acatado pela Susep, mas a percepção dos executivos com o resultado da primeira reunião é que 90% dos questionamentos serão resolvidos para que esse promissor segmento possa crescer de forma mais sólida. Em 2016 a carteira manteve um crescimento baixo, em torno de 1,5%, com prêmio direto de R$ 373 milhões.

Rafael Domingues, diretor de linhas financeiras da Chubb, conta que os sinistros mais comuns são demandas administrativas de órgãos reguladores como, por exemplo, CVM, PREVIC e Banco Central. Outros sinistros comuns que recaem contra os executivos referem-se a questões tributárias, ambientais e trabalhistas.

Segundo os entrevistados, há muitas oportunidades em empresa de capital fechado, onde a penetração do produto é baixa. "A recuperação do mercado de capitais também pode influenciar positivamente o mercado de D&O", aponta Bandeira. O mercado de pequenas e médias empresas também está no alvo das seguradoras. "Conseguir atender de maneira consultiva cada cliente mantendo o mesmo nível de excelência é o principal desafio neste mercado", diz o corretor da Aon.

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