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Lava-Jato muda percepção de risco por seguradora

Fonte: Valor Econômico

Por André Ramalho e Daniela Meibak | Do Rio e de São Paulo

Em meio aos desdobramentos da Operação Lava-Jato sobre os negócios da indústria de óleo e gás, o Brasil se tornou destaque mundial em processos contra executivos no setor de energia e mineração. Levantamento global feito pela JLT, corretora e consultora de riscos internacional, mostra que os gestores brasileiros são aqueles, entre seus pares no mercado mundial, com maior potencial de perdas financeiras em indenizações - seja em disputas travadas na Justiça ou em órgãos reguladores.

Esse cenário, consequentemente, tornou o Brasil um lugar mais "litigioso" para as seguradoras que trabalham com seguro de responsabilidade civil para executivos, conhecido como D&O (sigla para "directors and officers liability"). A JLT estima em cerca de US$ 7 bilhões as potenciais perdas dos executivos no mundo, tomando como base processos em curso e que podem levar os lesados a acionarem seus respectivos seguros. O Brasil responde por 37% desse total, seguido pelos Estados Unidos (26%), Argentina (22%), Ucrânia (10%) e México (5%).


Os números, de 2016, incluem as perdas potenciais dos gestores dos setores elétrico, óleo e gás e mineração e podem ou não se refletir em perdas para seguradoras - no caso do produto D&O, se for comprovado algum ato de corrupção ou fraude por parte do executivo processado, a seguradora não arca com as despesas.


A JLT destaca que, como resultado dos escândalos da Lava-Jato, cresceram os casos de ações movidas contra os administradores brasileiros por terceiros (acionistas, investidores, órgão reguladores), incluindo processos nos Estados Unidos, quando são envolvidas empresas domiciliadas no Brasil cujos títulos são negociados no mercado americana - casos de Petrobras, Eletrobras e Braskem.

No mundo, as maiores perdas - de US$ 3,4 bilhões - envolvem processos de práticas anticoncorrenciais. As práticas de propinas e comissões, por sua vez, totalizam US$ 2,4 bilhões, sendo US$ 2,2 bilhões somente na América Latina.

Vice-presidente de linhas financeiras da JLT Brasil, Miguel Villela conta que a mudança da percepção das seguradoras sobre o país se deu em 2014, quando o Tribunal de Contas da União (TCU) condenou 11 ex-diretores da Petrobras por prejuízos de US$ 793 milhões com a compra da refinaria de Pasadena, nos EUA. A partir desse momento, segundo ele, as seguradoras passaram a rever as condições das apólices no país.

"As apólices no Brasil ficaram um pouco mais restritivas. Antes desse período [2014] elas cobriam custos de defesa dos diretores antes do trânsito em julgado. A partir desse momento, quando começa a Lava-Jato, as seguradoras começaram a restringir esse pagamento de custos de defesa. Começaram a pagar apenas depois do trânsito em julgado", explica.

Flavio Sá, gerente de linhas financeiras da seguradora internacional AIG, que oferece esse tipo de produto, confirma a mudança. No caso de qualquer alegação de pagamentos de valores indevidos ou algum aspecto previsto na lei anticorrupção, a seguradora não antecipa os recursos para cobrir os custos de defesa do executivo. Em caso de relacionamento de longo prazo com alguma companhia, a regra pode ser flexibilizada e a apólice reembolsa o executivo caso seja inocentado no fim do processo.

"Todas as questões tributárias, trabalhistas, concorrenciais e até previdenciárias continuam cobertas. No nosso portfólio global, o seguro D&O do Brasil é o mais amplo em relação aos outros países em que atuamos", diz Sá.

Também como consequência da Lava-Jato, as seguradoras ficaram receosas com companhias que possuem forte laço com o governo e, nesses casos, preços e condições das apólices foram ajustadas, acrescenta Maurício Bandeira, gerente de Produtos Financeiros da corretora Aon. O mercado entendeu os principais riscos e aplicou os termos e condições diferenciadas quando necessário, segundo ele.

O setor de óleo e gás vem sendo prejudicado ainda pelas oscilações nos preços do petróleo, que têm castigado as companhias do ramo nos últimos anos. Com balanços piores, os riscos aumentam e os seguros ficaram mais caros. "Se existe algum problema no balanço, a companhia pode ficar insolvente de maneira mais rápida e o executivo ser demandado indiretamente. Existe toda uma análise financeira na hora de precificar um D&O", explica Bandeira.

Embora seja emergente, o mercado total brasileiro de D&O vem amadurecendo, segundo Villela, da JLT. Ele destaca que os executivos brasileiros "aprenderam" a acionar suas apólices e que pequenas e médias empresas passaram a se interessar mais pelo produto. "Se por um lado existe hoje no Brasil um maior pagamento de sinistros por parte das seguradoras, há também uma maior injeção de novos prêmios", comenta.

Dados da Superintendência de Seguros Privados mostram que os prêmios emitidos no ramo subiram 52,8% de 2014 para 2015, passando para R$ 359,9 milhões. No ano passado, avançaram mais 6%, para R$ 381,6 milhões. A contratação sobe desde 2010, na esteira dos processos contra executivos da Sadia e da Aracruz após os prejuízos com uso de derivativos, ainda de acordo com o gerente da AON. A partir desses episódios, os diretores buscaram mais a proteção.

Na outra ponta, os sinistros ocorridos subiram 9,33% em 2015, ante o ano anterior, somando R$ 141,4 milhões, mas cederam 1,5% no ano passado, para R$ 139,3 milhões.

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