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Procura por 'seguro ciber' mais que dobra após Lei de Dados

Fonte: Valor Econômico

A nova Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) impulsionou muito mais do que a busca pela segurança de informações de clientes e funcionários das companhias. A partir da promulgação da nova legislação, em agosto deste ano, a demanda pelo seguro contra riscos cibernéticos mais que dobrou, segundo empresas do ramo e especialistas.

A consultoria especializada em riscos, seguros e previdência Willis Tower Watson, por exemplo, indica um aumento de 116% na demanda por esse tipo de apólice. A Aon, outra especialista em análise de riscos e seguros, também verificou um salto de 115% na busca pela solução. Já a seguradora JLT reporta grande procura pela proteção. Segundo Marta Schuh, especialista em risco cibernético da companhia, "a demanda mais do que dobrou".

Empresas de todos os tamanhos vão ser impactadas pela nova lei. Conforme Ana Albuquerque, gerente de linhas financeiras da Willis Towers Watson, o movimento comprova essa percepção: "temos visto procura por organizações de todos os perfis, desde companhias de capital aberto até startups".

A promulgação da lei de dados, que entra em vigor apenas no início de 2020, intensificou os holofotes sobre um problema que cresce a uma taxa de dois dígitos ao ano - em 2017, houve um aumento de 44% nos ataques cibernéticos às empresas e pessoas no mundo, informa o relatório Cyber Security Insights da Norton, divisão da Symantec.

O estudo mostra que, em 2017, o Brasil foi a segunda nação com o maior número de crimes cibernéticos no mundo, superado apenas pela China. De acordo com o levantamento, mais de 62 milhões de brasileiros foram impactados de alguma forma. O prejuízo no país, aponta a Norton, alcançou US$ 22 bilhões.

O "phishing", golpe no qual os criminosos usam e-mails ou sites falsos para roubar informações pessoais, senhas, dados de cartões e bancários, é o tipo de ataque mais comum no Brasil. O celular aparece como o dispositivo mais afetado pelos ataques.

Já em âmbito mundial, os crimes cibernéticos causaram US$ 550 bilhões em perdas no ano passado, segundo a Aon. Em outra estimativa, a Willis Tower Watson indica que os danos podem se multiplicar por 10 nos próximos quatro anos. De acordo com a consultoria, o prejuízo por atingir US$ 6 trilhões anuais globalmente a partir de 2021.

"Já existe uma espécie de indústria de ataques cibernéticos, alguns até com suporte de governos", afirma Elizabeth Gurney, responsável pelo desenvolvimento de produtos ciber para a América Latina da Willis Towers Watson. Conforme a executiva, atualmente, existe uma mudança nos riscos relacionados ao mundo digital e um dos que mais cresce é o do terrorismo cibernético. "Há suspeitas de que muitos ataques a empresas, por exemplo, de energia ou de petróleo, são crimes do gênero."

Para Elizabeth, quanto mais se acelera a incorporação de tecnologia no dia a dia mais avançam também as vulnerabilidades. O quadro descrito pela profissional parece saído de um filme de espionagem estilo "Missão Impossível", mas é uma realidade: "uma conexão wi-fi, uma câmera digital, qualquer coisa 'inteligente' se torna um risco", acrescenta.

O chamado "seguro ciber" foi criado para proteger a empresa ou, ao menos, diminuir os impactos relacionados a ataques hacker, vazamentos de dados e ameaças digitais. Conforme as seguradoras, o produto busca transferir riscos relacionados a uma ampla gama de problemas, desde perdas de dados, violação e privacidade, roubo ou perda de informação confidencial, a perdas por lucro cessante, no caso de interrupção operacional da empresa como resultado de um ataque cibernético, ciberextorsão, e multas regulatórias por quebra de proteção de dados. Muitas apólices cobrem até mesmo danos à imagem da companhia, por exemplo, ou indenizações por danos morais movidos por vítimas de um vazamento.

A especialista da JLT explica que as seguradoras, antes de um cliente efetivamente contratar o seguro ciber, fazem uma análise de vulnerabilidades da empresa. "É preciso realizar um diagnóstico para quantificar os riscos e ajudar a companhia a identificar e lidar com eventuais problemas de segurança digital, compliance e outros fatores", diz Marta.

De acordo com a executiva, as taxas para a contratação do seguro ciber têm variado de 0,5% do capital segurado até 1,5%, com média de 1% nas diversas indústrias. O prêmio pago pelas empresas varia conforme o perfil de risco, o tamanho de exposição ao armazenamento de dados ou ainda se a preocupação é segurar a perda financeira, ou seja, o lucro cessante, entre vários outros fatores. "Uma fábrica de abatimento de frango, por exemplo, que nos contratou, tem toda a operação controlada por sistemas e se isso for atacado resulta em perda operacional e financeira para o grupo", conta.

A LGPD vai afetar todos os setores e empresas dos mais variados perfis, das gigantes às pequenas organizações, explica o CEO da Finnet, fornecedora de soluções de infraestrutura de tecnologia da informação, e representante brasileiro no grupo internacional dedicado à padronização mundial do blockchain da Organização Internacional para Padronização (ISO, na sigla em inglês), Yoshimiti Matsusaki. "A nova lei vai elevar o nível de tratamento de informações das empresas iniciantes e também, na outra ponta, limitar a exploração dos dados pelas grande companhias", resume o especialista.

A adaptação à nova realidade jurídica vai levar à implementação de novas funções para as organizações. "A lei passa a definir e identificar os papéis e responsabilidades, como o operador que manipula os dados, o controlador da informação, que vai fiscalizar, e o encarregado, que seria o responsável pelos dados dentro da companhia", afirma Matsukaki. "A nomeação de um responsável, seja uma área ou uma pessoa, pela proteção das informações traz uma grande melhora de governança", acrescenta.

Sob a ótica da LGPD, as empresas em geral terão de mapear como os dados são tratados e armazenados, porque qualquer manipulação de dados pessoais terá de ter o consentimento do consumidor ou do funcionário. E as formas e consequências de como as informações serão usadas terão de ser comunicadas de maneira patente aos envolvidos. "Nos termos de uso, a utilização do dado terá de estar destacada e a pessoa precisa dar um aceite específico", explica Luiz Di Sessa, especialista em tecnologia e propriedade intelectual do escritório Cescon Barrieu.

"Todo mundo vai ter de revisar contratos, fazer relatórios de impacto, de privacidade e reforçar a segurança", pondera o advogado. Na avaliação de Di Sessa, novas preocupações vão ser adicionadas, por exemplo, nas operações de fusões e aquisições. "Tenho a convicção de que o ambiente definido pela nova legislação poderá ser considerado até mesmo um novo ramo do direito", afirma. "As organizações, por exemplo, terão de redobrar o cuidado com os fornecedores, porque o risco é solidário."

A LGPD vai "compartilhar princípios essenciais como consentimento, transparência, auditoria, fiscalização e penalidades, em casos de incidentes de segurança, como vazamento de informações", explica Renato Opice Blum, coordenador dos cursos de direito digital e proteção de dados do Insper. Para o especialista em direito digital, "ter um profissional especializado na nova lei brasileira é uma situação irreversível e o melhor custo-benefício para as organizações".

O prazo para as organizações se adequarem às exigências vai até fevereiro de 2020, quando entra em vigor a LGPD. Quem violar a nova lei estará sujeito a multas que podem chegar a 2% do faturamento da empresa, dentro do limite de R$ 50 milhões por infração.

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