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Plataformas virtuais querem ser a terceira via entre o SUS e planos de saúde

Fonte: Folha de São Paulo

Healthtechs avançam, mas ainda não são reguladas, têm pouco alcance e cobertura restrita

São Paulo 

Insatisfeita com os reajustes no preço de seu plano de saúde, a massoterapeuta Cenira Primão, 54, resolveu testar um aplicativo de marcação de consultas e exames online, por indicação de um amigo. Seduzida pelos preços até 50% menores do que uma consulta particular, percebeu ali uma opção para se cuidar gastando menos. 

Virou fã: há três anos usa a tecnologia para realizar seus checkups semestrais e para consultas com especialistas. Até suspendeu o convênio médico. “Com a plataforma, vou ao médico com mais frequência do que quando tinha plano de saúde. Até consegui tratar problemas crônicos, como alergia”, diz. 

Autônoma, ela vê as empresas que oferecem serviços de saúde como uma alternativa entre o SUS (Sistema Único de Saúde), onde uma consulta com especialista pode demorar meses para ser marcada, e o sistema privado, cujos custos são mais elevados. 

“É uma opção que cabe no bolso e entrega bom atendimento”, afirma.

Consolidar-se como uma terceira via entre o sistema público e a saúde suplementar é a ambição das chamadas healthtechs, startups que utilizam tecnologia para prover atendimentos médicos. 

A Associação Brasileira das Startups (Abstartups) estima que 3% das startups de sua base de dados, com mais de 7.000 empresas, são da área de saúde —um total de 489, mas que podem ser ainda mais. 

A empresa escolhida por Cenira para marcar suas consultas e exames foi a Vida Class. A startup lançou-se no mercado em 2015, idealizada pelo português Vitor Moura, ex-diretor financeiro do Hospital Albert Einstein.

A empresa funciona como um marketplace no qual os pacientes podem consultar médicos, clínicas e laboratórios em uma rede que já conta com 13,5 mil prestadores de serviço em todo o país. 

Para ter acesso ao sistema, basta se cadastrar na plataforma, que não cobra mensalidade. Os prestadores de serviço, entre eles grandes laboratórios, oferecem descontos para combater a ociosidade de suas redes.

Um giro pelo aplicativo mostra consultas até 70% mais baratas e exames com descontos de 60%.  
No modelo de negócios da Vida Class, a startup lucra com uma fatia de 7% sobre cada consulta ou procedimento agendado. “Só cobramos quando sai negócio”, diz Moura. “Nosso público-alvo são os 160 milhões de brasileiros que não podem pagar por um plano de saúde”, afirma. 

Moura conta que, ao criar a plataforma e propor o negócio aos médicos e laboratórios, poucos acreditaram no sucesso da empresa. Mas a popularização dos smartphones e a maior facilidade nos meios de pagamento —é possível pagar com boleto bancário— eliminaram o ceticismo. 

Além de criar uma base com 240 mil clientes cadastrados, a startup de Moura já lançou novos produtos, como um seguro que cobre diárias de internação, e planeja expandir os serviços para outros países da América Latina. 

A Consulta do Bem também foi criada com a intenção de, por meio de uma plataforma, aproximar pacientes de médicos que tinham ociosidade nas agendas.

A startup começou a operar em 2016, inicialmente voltada para clientes pessoas físicas. Mas logo os fundadores perceberam que havia também uma demanda por parte das PMEs (pequenas e médias empresas).

“Notamos que muitas empresas usaram a plataforma para agendar consultas para seus funcionários. Isso redirecionou nosso negócio”, diz Rafael Morgado, sócio-fundador da Consulta do Bem.
Atualmente a empresa trabalha tanto com pessoas físicas como com as jurídicas, por meio de assinaturas.

As pessoas físicas pagam R$ 30 mensais para ter acesso a consultas por valores subsidiados (até R$ 150), além de exames. Empresas com até 50 funcionários pagam R$ 150 mensais e geram “créditos” para serem utilizados em serviços médicos.

Em dois anos de operação, a Consulta do Bem conquistou uma base com aproximadamente 20 mil pacientes, a maioria empregados de pequenas e médias empresas.

O filão das clínicas populares foi a aposta da Docctor Med, rede criada em 2013 em Alvorada, na Grande Porto Alegre, e hoje está presente em 14 estados por meio de franquias. 
A rede oferece consultas a partir de R$ 80, exames de sangue por R$ 5 e checkups variados, como o de saúde da mulher, por R$ 500.

Os valores podem ser parcelados no cartão de crédito, o que atrai tanto usuários do SUS que não querem esperar por uma consulta com especialista quanto ex-beneficiários de convênios médicos. 

“A demanda cresceu nos últimos anos, principalmente entre a faixa da população que perdeu o plano de saúde”, diz Geilson Silveira, fundador da Docctor Med. De olho nessa lacuna, a empresa já oferece opções corporativas, como um cartão que garante cobertura ambulatorial aos funcionários das empresas. 

Médicos analisam resultados e fazem laudo a distância

As inovações das startups da área de saúde não se restringem a aplicativos ou clínicas de baixo custo. A distribuição desigual dos médicos pelo país e a falta de acesso à medicina de ponta em várias regiões levaram à criação da Portal Telemedicina. 

A empresa lançou há cinco anos uma plataforma que permite aos médicos emitirem laudos virtualmente para clínicas e hospitais em tempo real. Assim, exames realizados em qualquer região do país podem ser analisados por médicos especialistas.

A startup produz, 24 horas por dia, milhares de laudos em dez especialidades médicas.
“Essa tecnologia traz dois grandes benefícios: a automação do fluxo de exames, que prioriza as emergências, e a detecção automática de patologias”, explica Rafael Figueroa, especialista em machine learning e um dos fundadores da Portal Telemedicina. 

A tecnologia já é utilizada em 160 cidades do país e chamou a atenção do Google, que escolheu a startup para seu programa de aceleração no Vale do Silício. 

Apesar dos avanços que trazem ao setor de saúde, as healthtechs ainda enfrentam limitações. Não são reguladas pela ANS, sua cobertura geralmente se restringe a consultas e exames e ainda são pouco conhecidas no país. 

Rafael Morgado, da Consulta do Bem, reconhece que ainda não existe uma solução de startup de grande escala. “Essas empresas ainda não atingiram as massas”, afirma.


3% 
das 7.000 startups do país são da área da saúde, segundo estimativa da Associação Brasileira das Startups

160 
cidades são alcançadas pelo Portal Telemedicina, plataforma que permite aos médicos emitirem laudos virtuais para clínicas e hospitais em tempo real

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