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O clausulado da apólice - por Antônio Penteado Mendonça

Fonte: O Estado de São Paulo

Cada seguradora escreve o que quer na apólice, empregando as definições que lhe parecem mais convenientes. E isso pode resultar em indenizações completamente diferentes

A operacionalização do seguro se dá através de um contrato chamado apólice de seguro que regula todas as relações entre a seguradora e o segurado. No Brasil, tudo que diz respeito a um determinado seguro deve constar da apólice, a começar pela proposta assinada pelo segurado.

Além da proposta, a apólice pode ser completada ou modificada por endossos, aditivos, faturas, etc., todos documentos oficiais e que passam a integrá-la. Para o negócio do seguro não existe carta de gaveta, condições confidenciais ou arranjos secretos.

Como o brasileiro não gosta de ler contratos, a maioria das pessoas imagina que todas as apólices de um determinado ramo são iguais. Não são.

Cada seguradora tem liberdade para escrever seu clausulado, definindo as garantias, as formas de cobertura, franquias, participações obrigatórias, riscos excluídos, bens não cobertos, perdas de direito, renovação, e o mais que integrar o contrato, usando uma redação própria, que pode estender ou reduzir as garantias, se comparadas com um seguro semelhante, tornando cada tipo de apólice um produto único que não se confunde com outros, por mais parecidos que sejam.

Um seguro de automóvel emitido por uma determinada seguradora pode ser bastante diferente de outro seguro de automóvel, emitido pela mesma companhia. Não existe a obrigação de uma seguradora comercializar um único tipo de apólice para cobrir um mesmo tipo de risco.

A companhia de seguros tem liberdade para desenvolver quantas apólices achar conveniente, de acordo com seu plano de marketing e suas estratégias comerciais.

Aliás, as apólices podem variar de ano para ano, em função de modificações que a seguradora introduz, seja lá pela razão que for. Também podem variar porque o corretor de seguros opta por um produto mais barato para um determinado cliente e outro mais caro para um segurado que deseja um seguro mais sofisticado.

Na medida em que as redações não são obrigatoriamente as mesmas, cada seguradora escreve o que quer, empregando as definições e palavras que lhe pareçam mais convenientes. E isso pode resultar em indenizações completamente diferentes para riscos cobertos por apólices semelhantes.

Por exemplo, o Superior Tribunal de Justiça pacificou o entendimento de que os "danos pessoais" englobam os "danos morais". Aliás, ele fez isso em absoluta consonância com a Constituição Federal.

Assim, o caminho para manter o seguro de responsabilidade civil dentro de seu conceito original foi substituir o nome da cobertura de "danos pessoais" por "danos corporais", onde fica implícito apenas o dano ao corpo humano, ou seja, exclui-se o "dano moral" que necessita assim uma cobertura especial. Como até hoje existem seguradoras que definem a cobertura como "danos pessoais", nestes seguros o segurado não precisa comprar garantia para "danos morais".

Da mesma forma, uma exclusão que determina que não estão cobertos os acidentes em que o segurado tenha consumido drogas ou bebida alcoólica é diferente de uma exclusão que diga que o risco excluído é a embriagues do segurado. E as duas são diferentes de uma exclusão que disponha que não estão cobertos os acidentes em que o motorista do veículo segurado tenha consumido álcool ou drogas.

As três situações, pelas palavras empregadas, não se confundem. No primeiro caso, se o motorista não for o segurado, tanto faz se consumiu drogas ou álcool, o sinistro está coberto. No segundo, quem tem que provar a embriaguez do segurado é a seguradora e embriaguez é completamente diferente de consumir álcool. Além disso, se o motorista no momento do acidente não era o segurado, o risco está coberto, ainda que estando bêbado. Finalmente, no terceiro caso, tanto faz quem é o motorista, se ele houver consumido álcool, a seguradora pode negar a indenização.

É bom que os tribunais decidam, grosso modo, seguindo esta linha. Como quem escreve o clausulado da apólice é a seguradora, nada mais justo que ele ser interpretado a favor do segurado.

É ADVOGADO, SÓCIO DE PENTEADO MENDONÇA ADVOCACIA, PROFESSOR DA FIA-FEA/USP E DO PEC DA FUNDAÇÃO GETÚLIO VARGAS E COMENTARISTA DA RÁDIO ELDORADO. E-MAIL: ADVOCACIA@PENTEADOMENDONCA.COM.BR

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