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Microsseguros não atraem morador de favelas do Rio

Fonte: Valor Econômico

Negócios: Projeto no Morro Dona Marta ainda esbarra na desconfiança

Com muita dificuldade, as seguradoras tentam convencer moradores de comunidades pobres a comprar seguros. Dezesseis seguradoras se juntaram este ano em um projeto para levar microsseguros ao Morro Dona Marta, Zona Sul do Rio de Janeiro. O projeto, intitulado Estou Seguro, pela Organização Internacional do Trabalho (OIT), com recursos da Fundação Bill & Melinda Gates - do dono da Microsoft -, caminha para a segunda etapa sem ter conquistado os potenciais compradores nas favelas.

Vendemos menos de 20 seguros, afirma Pedro Bulcão, diretor executivo da Sinaf Seguros, uma das participantes do projeto Dona Marta. Apesar disso, Bulcão defende a ideia: Por enquanto, o trabalho foi mais no sentido de informar.

Marco Antonio Gonçalves, diretor gerente do grupo Bradesco Seguros, define o objetivo do projeto do qual o maior grupo segurador brasileiro participa junto com outras 15 empresas: Queremos preparar o público para que entenda o que é o seguro, afirmou Gonçalves.

Fazer com que as pessoas entendam o seguro tem sido o maior desafio, dizem participantes do Estou Seguro. As pessoas aqui acham que tudo isso é enrolação, que a seguradora não paga, afirma Joaquim Melo, coordenador geral do Instituto Palmas, que também está implementando um outro projeto de microsseguros, este na comunidade Conjunto Palmeiras, na periferia de Fortaleza (CE), em parceria com a Zurich Seguros.

Diana Bueno, diretora da divisão bancassurance da Zurich, acha que esse conceito de que as seguradoras não pagam pode ter se formado por investidas recentes de seguros massificados. Por esta modalidade - que não é microsseguro - são vendidas coberturas através de contas de luz, gás, crediários e faturas de cartões de crédito, com o apelo do preço baixo para coberturas de pequeno valor.

Ocorre que, para viabilizar uma cobertura mais simples e barata, as seguradoras de massificados oferecem apenas o seguro por morte acidental, que custa muito menos que o de morte natural. Como as pessoas têm pouco conhecimento, compraram seguro por morte acidental achando que era por morte natural. Consequentemente não foram indenizadas em todos os casos de morte, explica Bueno.

Porém há outros entraves, além da falta de cultura e conhecimento. O microsseguro nem sequer existe na legislação brasileira. Um projeto de lei criando uma legislação específica para a venda de seguros mais simplificados e baratos está parado no Congresso Nacional, à espera de votação. Com isso, explica Pedro Bulcão, fica difícil fazer um preço que os mais pobres possam pagar. As regras atuais não são adequadas para seguros de baixo valor, diz o diretor executivo da Sinaf, que tem participado do comitê coordenador do Estou Seguro na condição de colaborador.

A legislação atual do seguro tem uma série de exigências que encarecem o serviço, diz Bulcão. Uma delas é o contrato obrigatório (apólice) que deve ser entregue a cada segurado. O texto é longo, consome páginas e páginas, muitas vezes com termos técnicos absolutamente herméticos para o cidadão comum.

Outra exigência é o controle de lavagem de dinheiro e de pessoas politicamente expostas, que exige a contratação de profissionais especializados para revisar o cadastro dos clientes. Tudo isso tem um custo, explica Bulcão, lembrando que são controles que não fazem sentido em se tratando de pessoas de baixa renda. O resultado é que o pobre acaba pagando mais do que devia.

A distribuição também é complicada. A lei brasileira determina que seguros só podem ser vendidos através de corretores, que em geral ganham uma comissão sobre as vendas. Com tíquete médio de R$ 30, o microsseguro não interessa aos corretores, explica Emilio Rodrigues Gomes, corretor profissional contratado pela CNSeg para coordenar o treinamento de agentes de venda.

No piloto do projeto, foram recrutados quatro agentes - uma cabeleireira, um estudante, um segurança privado e um instrutor de jiu-jitsu - , jovens moradores do Morro que exercem outros trabalhos.

Os agentes foram treinados pela Bradesco Seguros que patrocina também a Casa do Seguro, um pequeno escritório instalado na comunidade, com internet e telefone, que serve de base operacional para os agentes.

Eles não ganham comissão, mas um salário mínimo como auxílio por dedicarem-se ao trabalho Estou Seguro que consiste em visitar potenciais clientes, informar, orientar e encaminhar a compra, explica Gomes. Eles não têm que vender, mas sim disseminar a ideia do seguro, afirma Marco Antonio Gonçalves, da Bradesco.

Avançar no segmento mais pobre é uma decisão estratégica da Bradesco Seguros, como já havia dito ao Valor o diretor vice-presidente executivo do grupo, Samuel Monteiro dos Santos Junior. A companhia já estava testando o seguro popular na favela de Heliópolis em São Paulo e a intenção é ampliar a oferta com seguro residencial, que já está sendo vendido no Dona Marta. O próximo passo, disse Santos, será oferecer planos odontológicos de baixo custo.

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