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O dilema da Kia

Fonte: Isto É Dinheiro

As vendas da montadora batem recorde no País. Mas poderiam ser ainda maiores se a marca recebesse mais carros da matriz coreana

Por Rafael Freire

Uma das melhores sensações para qualquer homem de negócios é ver a expansão de sua marca a cada ano. O paulista José Luiz Gandini, presidente da Kia Motors do Brasil, importadora oficial dos carros da montadora coreana no País, vem desfrutando desse privilégio nos últimos tempos. De 2008 a 2010, a Kia aumentou suas vendas no Brasil em 168%, de acordo com dados da Fenabrave, entidade que representa as distribuidoras de veículos. No primeiro semestre de 2011, os números foram ainda mais animadores: o crescimento chegou a 78%.

A expansão só não foi maior do que a da japonesa Nissan, que, no período, cresceu 84,6%. Com isso, a Kia viu sua participação de mercado passar de 1,6%, no final de 2010, para 2,5%, no acumulado dos seis primeiros meses deste ano. Esse salto não aconteceu por acaso. Desde 2007, a marca passou por uma grande transformação. Um dos grandes marcos de sua história foi a contratação do designer alemão Peter Schreye, que tem em seu currículo o desenho de modelos como o Audi TT e o Volkswagen New Beetle. Schreye deu aos veículos coreanos um toque mais ocidental, que colocou a Kia em destaque em diversos mercados mundiais. O Brasil foi um deles.

Com a nova identidade visual, a marca conseguiu desatrelar sua imagem da antiga perua Besta, sua principal oferta nos anos 90, e passou a ser vista como uma montadora de veículos premium. “Hoje, nossos carros são sonhos de consumo”, afirmou Gandini à DINHEIRO. Para consolidar essa imagem, o empresário não poupou investimentos em marketing. Em 2010, a Kia investiu R$ 90 milhões em propaganda. Neste ano, a previsão é desembolsar mais R$ 150 milhões. De acordo com levantamento feito pela agência de informações AutoData, a coreana gastou em publicidade o equivalente a R$ 6,8 mil do valor de cada carro vendido.

Ela só ficou atrás da compatriota Hyundai, que faz parte do mesmo conglomerado da Kia, e que desembolsou cerca de R$ 12,5 mil por carro comercializado. Outra tacada certeira de Gandini foi o lançamento do compacto Soul, em versão flex, único veículo importado bicombustível. “As vendas do Soul dobraram, em comparação ao motor apenas com gasolina”, diz Gandini. Até meados de 2012, o empresário pretende aplicar a tecnologia em todos os modelos com motor abaixo de dois litros, incluindo o novo Picanto, que começará a ser vendido a partir de agosto deste ano.

Mas esse crescimento acelerado da Kia, no Brasil, pode ficar comprometido nos próximos anos. Por uma razão bem prosaica: falta produto para vender. “Não tenho uma cota de carros suficientemente grande para explorar todo o potencial do mercado”, afirma. “Trabalho com estoque zero.” Essa escassez de produto já vem fazendo o empresário tirar o pé do acelerador. Gandini acredita que poderia chegar a uma participação de mercado de até 3,5% no Brasil em 2012. Mas como a matriz coreana não quer aumentar o volume de veículos enviados da Coreia do Sul para o Brasil, ele é realista e diz que deve se manter com os atuais 2,5% em 2011, o que significa vender 90 mil unidades.

A rede de revendedores, atualmente com 180 distribuidores, também não deverá ser ampliada tão cedo. “Não adianta ter mais concessionárias se a quantidade de carro que podemos importar ainda é a mesma”, diz Gandini. De acordo com Fernando Trujillo, consultor da CSM WorldWide, essa estratégia é a melhor forma de não gerar um desgaste na imagem da Kia. “Vender mais do que se pode entregar é muito prejudicial para qualquer montadora no País”, afirma Trujillo.

Desde 2008, especula-se bastante sobre a construção de uma fábrica da marca coreana no Brasil. Sabe-se que Gandini até já comprou um terreno de 510 mil metros quadrados na cidade de Salto, interior de São Paulo, para erguer essa base produtiva local. Questionado, o empresário não quis se pronunciar sobre o assunto, dizendo que se trata de uma decisão conjunta entre a Kia Motors do Brasil e a Kia Motors Corporation. Procurada por DINHEIRO, a Kia Motors Corporation apenas informou “estar aumentando sua produção para atender ao crescimento mundial de demanda pelos seus carros”. Fontes ligadas à montadora, no entanto, dizem que o maior empecilho ao projeto é uma pendência fiscal com o governo brasileiro deixada pela extinta Asia Motors, uma marca controlada pela Kia Motors na Coreia.

Na década de 90, o grupo brasileiro que importava os carros da Asia Motors anunciou investimentos para a construção de uma fábrica na Bahia em parceria com a Asia Motors da Coreia. Com isso, passou a contar com isenção da alíquota de importação de seus carros. Como o projeto nunca saiu do papel, os benefícios fiscais viraram uma dívida estimada atualmente em R$ 1,8 bilhão. Hoje, a matriz da Kia briga na Justiça para se desvencilhar dessa cobrança.

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