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Cautela e caldo de galinha

Fonte: O Estado de São Paulo
 
por Antônio Penteado Mendonça

Dizia o ex-governador de São Paulo, Orestes Quércia, que cautela e caldo de galinha nunca fizeram mal a ninguém. O provérbio é antigo e quem conhece o interior paulista, na região da divisa com Minas Gerias, já o escutou mais de uma vez. Os provérbios são a consolidação da experiência coletiva, passada adiante de forma simples para balizar a vida das pessoas, evitando que façam coisas das quais possam se arrepender. Em outras palavras, são lições de vida reduzidas a frases de efeito para chamar a atenção sobre comportamentos que comportam algum tipo de risco. Por que uma explicação sobre os provérbios num artigo sobre seguros? Porque a Susep tem se atirado com muita sede ao pote e os resultados podem ser bem diferentes dos imaginados.

Até 1986 o setor de seguros brasileiro era tarifado pelo IRB, então Instituto de Resseguros do Brasil, órgão monopolista que controlava muito mais que o resseguro, já que, de verdade, era quem dava as ordens no mercado. A Susep, àquela época, não passava de uma simples registradora dos procedimentos societários das seguradoras. Quem mandava era o IRB e a forma mais evidente de ver seu poder eram as tarifas únicas, obrigatórias para todas as companhias de seguros do país.

Por volta de 1986, por conta de uma série de eventos que não vêm ao caso, a Susep passou a ter poder regulatório, o IRB focou mais no resseguro e as tarifas únicas, começando por incêndio e lucros cessantes, foram flexibilizadas. Na mesma época, o seguro de veículos começou a ocupar o espaço que mantém até hoje, substituindo o seguro de incêndio como a carteira mais importante do mercado.
De lá para cá, entre erros e acertos, o setor passou o período da hiperinflação atendendo as necessidades básicas da sociedade, cresceu, saltou de menos de 1% do PIB para os patamares atuais e, principalmente, se abriu, com a abertura atingindo seu ponto alto em 2007, pela votação da lei da quebra do monopólio do resseguro.

A abertura do resseguro foi tão marcante que o governo, no meio do jogo, precisou mudar as regras para salvar o IRB, que vinha perdendo participação no mercado. E mesmo assim, hoje, o País tem mais resseguradoras autorizadas a operar do que grupos seguradores. Quer dizer, com mais de 110 resseguradoras registradas, o que não falta são empresas internacionais e nacionais interessadas em atuar no segmento do resseguro, dando suporte financeiro, técnico e mercadológico para as companhias de seguros em operação no Brasil.

É neste cenário que a Susep vem extrapolando, ao pretender, na prática, reintroduzir as tarifas únicas abandonadas há mais de 20 anos. A primeira consideração a ser feita é se ela tem poder legal para isso. Vários especialistas de renome, alguns deles reconhecidos internacionalmente como advogados com sólido conhecimento jurídico sobre o assunto, questionam se uma autarquia como ela teria o poder de determinar a forma como os seguros devem ser contratados, num mercado livre, onde a lei permite que os contratos firmados entre particulares façam lei entre eles.

Mas mais complicado é imaginar que as resseguradoras internacionais aceitarão as imposições da Susep e desenharão produtos específicos para o mercado segurador brasileiro, em desacordo com tudo o que é feito no mundo, por quem opera em seguros há séculos.

Vetar os seguros singulares, impor uma tarifa de responsabilidade civil, normatizar os riscos de petróleo e mudar a lei dos corretores de seguros por resolução pode ser perigoso para o setor e para o Brasil, onde importantes segmentos sociais, até então desprotegidos, começam a ter seguros para garantir seus patrimônios. E o que dizer do impacto destas medidas sobre o custo Brasil? Ao obrigar as empresas a se submeterem às suas regras, abandonando até programas mundiais de seguros, a Susep está encarecendo a produção nacional. Será que não seria mais útil ela se pautar pelo que fazem as autoridades reguladoras dos países onde o seguro é algo importante?

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