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Queda de juro pode ter efeito negativo em ação de seguradora

Fonte: Valor Econômico
Por Juliana Machado | De São Paulo
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Um ciclo de queda de juros como o Brasil vive atualmente tende a se desdobrar em uma sequência de efeitos positivos para a economia, seja por indicar que a inflação está controlada, seja por reduzir a pressão nos custos e favorecer os investimentos- fatores, sem dúvida, importantes para as empresas. Mas existe um grupo de companhias a que o investidor precisa ficar mais atento devido aos impactos negativos de curto prazo decorrentes da redução da taxa básica Selic: as seguradoras. Isso porque boa parte de seus resultados vem exatamente da linha financeira.

Pelas regras de solvência do segmento, essas empresas precisam ter reservas de capital e esses recursos são remunerados principalmente por aplicações que acompanham a Selic. Com o novo corte do juro básico na semana passada, para 7,5%, e a perspectiva de pelo menos outra redução da taxa neste ano (a 7%), especialistas ouvidos pelo Valor apontam a possibilidade de as seguradoras terem mais uma piora em seus resultados financeiros. Entre as companhias do setor com ações negociadas em bolsa, o cenário seria mais preocupante para Porto Seguro e SulAmérica, sendo que BB Seguridade tenderia a ser menos afetada, na avaliação dos especialistas.

Isso não significa que o setor entregará prejuízos ou que a melhora da conjuntura econômica como um todo não o beneficie. Mas, ao menos no curto prazo, as ações de seguradoras devem passar por ajustes de preços, o que têm influenciado as decisões de investimento de gestores.


Levantamento da Superintendência de Seguros Privados (Susep) com 150 seguradoras mostra que o resultado financeiro caiu 34%, em média, no segundo trimestre na comparação com o mesmo período de 2016, de R$ 3,3 bilhões para R$ 2,2 bilhões. E a piora do resultado financeiro, conforme mostrou a divulgação dos balanços do segundo trimestre, ainda não conseguiu ser compensada por ganhos operacionais.

"Estamos menos expostos a alguns nomes no setor de serviços financeiros porque eles perdem com a queda dos juros. Não temos muita alocação em seguradoras e, neste caso, estamos falando mais de Porto Seguro e SulAmérica, que não estão no nosso portfólio", afirma Daniel Gewehr, estrategista de ações para Brasil e América Latina do Santander.

Em relatório recente, o Santander detalhou uma sequência de estratégias para investimentos em renda variável. Entre as oportunidades de pagamento de dividendos, o banco vê na BB Seguridade uma boa opção, já que cerca de 6% do lucro líquido da empresa é distribuído em proventos aos acionistas. "Mas, se for para tentar acertar quando comprar BB Seguridade, o melhor momento é quando o mercado parar de revisar a Selic para baixo", diz Gewehr. Segundo o último Boletim Focus, economistas esperam que a taxa de juros caia para 7% ainda neste ano, permanecendo aí até fim de 2018.

As recomendações das casas para o setor segurador mostram que, mesmo nos casos em que há indicação de compra, o potencial de alta já é limitado - apenas BB Seguridade ainda teria espaço para maior valorização.


No caso de Porto Seguro, a recomendação do Santander é "neutra", com preço-alvo de R$ 30, 20% abaixo do atual preço de R$ 37,38. Para a SulAmérica, com indicação também neutra, o preço-alvo fica em R$ 18,20, um potencial de alta de apenas 0,55% ante os R$ 18,10 do pregão de sexta-feira.

O BTG Pactual tem recomendação para a Porto Seguro neutra, com preço-alvo de R$ 33,50 - ou 10,4% abaixo do valor atual do papel. Em relação à SulAmérica, apesar da recomendação de compra, o preço-alvo, de R$ 18,00, está 0,55% abaixo do preço atual.

A parcela de contribuição das operações financeiras no lucro das seguradoras muda caso a caso. Quanto maior for essa participação no resultado final, pior será o reflexo da baixa da Selic na linha final do balanço. Segundo o BTG Pactual, cerca de 70% do resultado de SulAmérica e Porto Seguro vem da linha financeira, enquanto na BB Seguridade representa 30%. Qualicorp, que não é sempre associada ao setor por ter operações mais particulares, tem entre 5% e 10% do lucro vindo do resultado financeiro.

Para os analistas Eduardo Rosman e Thiago Kapulskis, do BTG, o mercado já colocou nos preços das ações a queda dos juros e, apesar do reflexo sobre o resultado financeiro, empresas de seguros tendem a apresentar uma retomada operacional como resposta à recuperação econômica. No caso de Porto Seguro, resultados melhores das vendas de veículos no Brasil podem colaborar com o desempenho, já que parte importante da carteira da empresa é de seguros automotivos. Já a SulAmérica, que tem importante atividade no segmento de saúde, também pode vislumbrar receitas crescentes.

"Só que a recuperação econômica ainda é lenta e a melhora operacional no curto prazo não deve ser suficiente para ofuscar a queda do resultado financeiro", disse Rosman ao Valor. "Isso obriga as empresas a focar na rentabilidade do negócio, ou o impacto no lucro será duplo: da economia em recuperação lenta e do efeito dos juros."

Os analistas do BTG ponderam que, no processo de redução da Selic, as ações das seguradoras podem responder com alta, caso os resultados surpreendam o mercado. A dúvida, porém, persiste no caso de um cenário de juros consistentemente em queda. "É importante pensar que quando a Selic é alta, o risco está alto, ou seja, juro menor é positivo para a conjuntura geral", diz Rosman. "Mas não tem como o financeiro não ser pressionado nesse caso."

No caso de BB Seguridade, Rosman destaca que alguns fatores explicam o menor risco na comparação com os concorrentes, como as subsidiárias com margem operacional maior do que os pares e a corretagem com canal bancário - o Banco do Brasil -, por meio do qual a companhia consegue ter mais competitividade. Ainda assim, a própria companhia na divulgação de resultados do segundo trimestre revisou a estimativa de lucro para 2017 de alta de 1% a 5% para queda de 1% a 5%, por conta da redução do resultado financeiro em ritmo surpreendentemente mais acelerado.

"É também uma empresa de assimetria interessante, porque se tiver reforma da Previdência, as pessoas devem se interessar mais pela previdência privada, ao passo que, se não tiver reforma no médio prazo, a Selic deve voltar a subir, então ela começa a ganhar financeiramente", diz Gewehr, do Santander.

Para um gestor que preferiu não ser identificado, é arriscado, porém, comprar o papel da empresa prevendo a aprovação da reforma da Previdência, porque ainda não há clareza sobre o seu tamanho ou se de fato ela acontecerá. "Pensando em um cenário de recuperação econômica, é importante olhar não só a correlação com os juros, mas quem poderia colher maior benefício", diz. "Quem está com maior dificuldade neste caso é a SulAmérica, com a inflação médica alta e até mais relevante agora."

Em relatório recente em que elevou a meta do Ibovespa de 75 mil pontos para 80 mil pontos no fim deste ano, o Bank of America Merrill Lynch (BofA) ressaltou estar com exposição baixa ao setor financeiro, justamente devido "ao menor crescimento dos ganhos e à pressão sobre as margens, dado o forte ciclo de flexibilização monetária no Brasil".

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