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Desempenho de maiores fundos de previdência aberta deixa a desejar

Fonte: Valor Econômico
Por Adriana Cotias | De São Paulo

Os cinco maiores bancos do país concentram a poupança destinada à aposentadoria do brasileiro, com R$ 676,5 bilhões em fundos ligados à previdência aberta - ou mais de 90% do setor. Mas o desempenho histórico deixa a desejar. Ao se considerar a carteira de maior patrimônio de cada uma dessas instituições - Banco do Brasil, Caixa, Itaú, Bradesco e Santander -, esses portfólios, que reúnem cerca de R$ 120 bilhões, rendem 90% do CDI desde o lançamento, na média, segundo cálculos da fintech de investimentos Monetus.

Quando a taxa Selic estava na casa dos dois dígitos, tal performance parecia assegurar uma renda satisfatória na velhice. Agora, com a taxa básica de juros em 6,5% ao ano, o investidor talvez tenha que repensar sua tolerância a risco, bem como avaliar de perto os custos embutidos nas suas escolhas.

Nas mãos dos grandes conglomerados financeiros estão os portfólios mais conservadores do mercado e que, de certa forma, espelham o comportamento do investidor que se acostumou a ter retornos altos na renda fixa sem se aventurar por outros ativos. Para se ter ideia, diz Daniel Calonge, executivo-chefe da Monetus, 70% do volume aplicado em fundos ligados à previdência aberta rendeu menos que o CDI nos últimos 12 meses. Na gestão independente, fora dos bancos, ele diz ser possível encontrar portfólios tipicamente de renda fixa com retorno médio histórico entre 104% e 113% do CDI, mas com trajetória relativamente curta.

Levantamento da XP Investimentos para o Valor, com base em dados da Economática, mostra que nos últimos dois anos, período que coincide com a redução da Selic de 14,25% para 6,5%, menos de uma dezena de fundos de renda fixa vinculados a planos de previdência aberta superaram o CDI, entre aqueles com baixa volatilidade, seja em gestoras ligadas a bancos ou independentes.

Os custos, diz Calonge, podem até explicar parte da má performance dos grandes fundos de previdência, que têm taxas de administração entre 0,5% a 1,5% ao ano, mas não é só isso. O executivo cita não ser incomum gestores colocarem na carteira dos próprios bancos ou títulos públicos com compromisso de recompra, com taxas negociadas diferentes das asseguradas numa aquisição seca, e isso também pode deixar piorar o retorno.

Além do preço que o investidor paga pela gestão dos recursos, no pacote do plano de previdência vem cobradas taxas de carregamento, que representam um pedágio para entrar ou sair, mas que não interferem no desempenho do fundo. Conforme exemplifica Calonge, um investidor que tenha aplicado ao longo da vida R$ 1 milhão num plano que tenha 2% de carregamento vai ter, grosso modo, R$ 20 mil a menos no final - sem considerar eventual capitalização. Já R$ 600 aplicados mensalmente num fundo com retorno de 100% do CDI sem taxa de carregamento por 30 anos vão se converter em R$ 1,153 milhão e, se o retorno for um pouco maior, de 109% do referencial, a acumulação subirá a R$ 1,358 milhão ao fim do período.

O BB tinha nos fundos de previdência aberta R$ 233,5 bilhões, pelos dados de maio da Anbima, entidade que representa o mercado de capitais e de investimentos. Segundo Marcelo Wagner, diretor financeiro da Brasilprev, o fundo de maior patrimônio, com quase R$ 46 bilhões, pertence à família FIX, que no seu conjunto detém R$ 207 bilhões e é o carro-chefe da indústria.

Lançado em 2000, o Brasilprev RT FIX II rende, na média, o equivalente a 83% do CDI, segundo a Monetus, e é o que tem a taxa mais alta da amostra, de 1,5%, O plano ligado a ele foi constituído com base numa tábua atuarial que ficou defasada e quando o beneficiário converter o valor acumulado em renda vai usufruir das condições contratadas à época, diz Wagner. O executivo alerta que quem está num plano sob regras antigas não deve fazer "conta rasa" e se pautar pelo desempenho relativo ao CDI para tomar a decisão de migrar.

"Talvez seja mais interessante ficar e usar a posição embutida de conversão de renda do que portar apenas por causa do retorno abaixo do CDI. E vale lembrar que o CDI, neste período, foi provavelmente o ativo que mais rendeu no mundo, e que os produtos de conversão em renda estão praticamente em extinção."

O executivo lembra que um fundo de investimento tradicional é um condomínio e que os planos de previdência são um "bicho diferente", porque contam com uma apólice de seguro acoplada (VGBL ou PGBL) e o ativo que garante isso é o dinheiro acumulado no fundo.

Na rede do BB, Wagner diz haver produtos atualizados à nova dinâmica do mercado e com retornos comparativamente melhores. Há, por exemplo, fundos de renda fixa mais longos, da família Premium, que reúnem cerca de R$ 7 bilhões e que no ano passado tiveram retorno bruto de 126,5% em relação ao CDI. Outra inovação, prossegue, são os planos sob o conceito de data-alvo (2025 ou 2035), em que os gestores dos fundos calibram a alocação conforme o tempo que falta para o resgate. E sob as regras mais flexíveis do Conselho Monetário Nacional (CMN) houve ainda uma reestruturação nos multimercados que passaram a incorporar, por exemplo, ativos no exterior e conseguem capturar retornos entre 132% e 138% do CDI.

Progressivamente, a disposição para tomar mais risco pelo investidor tem crescido e isso se reflete na proporção de fundos de renda fixa, que caiu de 89,4% para 87,7% no mercado de dezembro passado até junho, enquanto a fatia de multimercados ligados à previdência cresceu de 10,6% para 12,3%, cita Wagner. "É uma coisa absolutamente esperada que, com a trajetória de queda de juros, o dinheiro da indústria migre para a renda fixa de prazo maior e estratégias de multimercados para que o cliente capture prêmio maior. Hoje está tudo muito concentrado na renda fixa de curto prazo."

No Bradesco, que detém R$ 197,2 bilhões em previdência aberta, o maior patrimônio está no VGBL F10, com R$ 39,2 bilhões e um histórico equivalente a 87% do CDI. Com taxa de administração de 1%, na largada, para proporcionar 100% do CDI, o fundo já parte de 85%, diz Vinícius Cruz, diretor de investimentos da Bradesco Seguros. Ele cita que em geral produtos com taxas nesse nível são de "gestão ativa de frequência baixa", com menor volatilidade, e por isso não estão aptos a capturar alguns movimentos relevantes do mercado Os fundos com tal mandato cobram mais caro, entre 1,5% e 2% de administração, mas também têm que correr mais risco para trazer um adicional que compense essa exposição. "Nossa abordagem na agência sempre questiona o cliente quanto a sua tolerância a risco, a capacidade dele para aguentar um ou dois meses de retorno negativo, o tempo que pretende usar o dinheiro", diz. "Tem muita gente que prefere um retorno estável a 90% CDI, e outros benefícios do diferimento do imposto de renda, do que correr risco."

Ele cita que há na rede multimercados mais dinâmicos que se beneficiaram nos últimos dois anos do corte de juros e valorização das ações na bolsa e que, mesmo com rentabilidade negativa entre maio e junho, no longo prazo ainda pagam a conta, com retornos entre 140% e 150% do CDI.

Como o objetivo de previdência é construir uma poupança para a aposentadoria, o investidor poderia aceitar ativos de prazo mais longo e até mais volatilidade na cota, diz Ricardo Almeida, diretor de investimentos da Bradesco Asset Management. "Ao mesmo tempo, ele tem que ter claro qual o seu perfil, porque infelizmente muita gente faz gestão de patrimônio olhando pelo retrovisor, entra e fica preocupado com movimentos de curto prazo."

O Caixa Renda Fixa 50 agrega um volume de R$ 11,5 bilhões, dos cerca de R$ 52 bilhões que o banco federal tem em previdência e roda com retorno de 97% do CDI, tendo a taxa mais baixa entre os grandes, de 0,5%. Após a Selic cair, quem estiver incomodado com o desempenho relativamente mais "magro" vai ter que colocar à prova a tolerância a risco, diz Sergio Bini, superintendente nacional de gestão de ativos de terceiros da Caixa.

"Se a taxa ficar em 6,5% por um longo tempo, pode ser que não seja suficiente para a poupança necessária para a aposentadoria, daí o investidor vai ter que assumir mais risco em outros tipos de fundo", afirma. "Quem não quiser um multimercado ou renda variável, vai ganhar algo perto de 6,5%."

Se o país conseguir sustentar a Selic num nível baixo, o brasileiro vai ter que vencer a cultura de investimentos baseada em juros elevados, diz Eduardo Castro, superintendente executivo da Santander Asset Management. "Num cenário em que o juro mais baixo se perpetue, o investidor vai ter que analisar as opções pensando de fato no longo prazo, ajustando isso à idade e ao período que imagina se aposentar", diz. "A renda fixa pode ser a parte mais relevante, mas o investidor tem que ter condições de tempo [prazo] para se aposentar e considerar a diversificação."

Um dos caminhos, diz, é aumentar a parcela de renda variável nos fundos balanceados ou incluir multimercados no leque, não só de gestores tradicionais como de independentes. Por ora, Castro diz que, em meio à incerteza com o quadro eleitoral e a uma dinâmica externa menos favorável a economias emergentes, a renda fixa voltou a ter prêmios, com taxas acima de 11% para 2025. "Mas isso não quer dizer que o investidor não tenha que pensar em diversificação."

No banco, o fundo de maior patrimônio conta com R$ 7,3 bilhões de um total de R$ 41,6 bilhões em previdência, com um retorno histórico equivalente a 91% do CDI, com uma taxa de administração de 0,90%. Castro diz que a grade já tem produtos um degrau de risco acima do veículo mais tradicional, combinando a alocação em renda fixa em diversos vencimentos.

Em meio ao lançamento de fundos de previdência por gestoras independentes, o Santander tem se mobilizado para ter opções à altura. Está no forno, por exemplo, a versão de previdência do novo multimercado sob gestão de Leonardo Breder, ex-Brasil Plural, para competir com essa nova safra. Não há, por enquanto, distribuição de fundos de terceiros na prateleira.

"Olhando alguns multimercados nos últimos três meses é possível encontrar fundo com rentabilidade muito ruim. Pode ser conjuntural, o horizonte [de previdência] é de longo prazo sem dúvida nenhuma, mas o investidor tradicional, acostumado à renda fixa, pode se assustar."

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