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TCU: impactos da corrupção em seguro-garantia para contratos públicos

Fonte: Estadão

TCU. Foto: DIDA SAMPAIO/ESTADAO

O Tribunal de Contas da União (TCU) publicou o recente Acórdão 1.216/2019 sobre a aceitabilidade, por órgãos da administração pública federal, de apólices de seguro-garantia, apresentadas por empresas vencedoras de licitações, que excluam o dever das seguradoras de cobrirem prejuízos e demais penalidades causados ou relacionados a fatos ou atos violadores de normas anticorrupção.

Essa decisão do TCU vem em momento bastante oportuno, por dois relevantes motivos.

O primeiro decorre da iminência da votação pela Câmara dos Deputados do PL 1.292/95 que trata de nova Lei de Licitações. O PL, que tramita em regime de urgência, pretende, dentre outras mudanças, aumentar o valor das garantias de execução de contratos administrativos. Haverá uma ampliação dos atuais 10% para até 30% do valor inicial do contrato a ser coberto por seguro-garantia no caso de obras e serviços de engenharia de grande vulto. Busca-se dar um papel preponderante ao seguro-garantia na defesa dos direitos da administração pública.

O segundo, se deve a exponencial identificação de casos de corrupção ao longo dos últimos anos e a constatação de que essa é, inescapavelmente, a tendência para o futuro. Segundo estatísticas divulgadas pela Polícia Federal, apenas em 2018, ocorreram quase 300 operações da Polícia Federal contra a corrupção.

Voltando ao cerne da questão, o TCU determinou que os órgãos da administração pública federal apenas aceitem apólice de seguro-garantia que contenha cláusula que exclua de cobertura prejuízos e demais penalidades causados ou relacionados a atos ou fatos violadores de normas de anticorrupção que tenham sido provocados ou envolvam a atuação dolosa do segurado (órgão da administração pública Federal contratante).

O posicionamento do TCU se alinha com a orientação da SUSEP na Carta Circular Eletrônica n.º 1/2018 que determina que havendo inadimplência contratual do tomador (empresa vencedora da licitação) perante o objeto do contrato principal, sem que atos ilícitos tenham sido praticados pelo segurado (administração pública contratante) em relação ao contrato com seguro-garantia, a seguradora não poderá se isentar do pagamento da indenização.

A decisão tem o mérito de impedir que a administração pública (ou seu representante) eventualmente se beneficie de sua própria torpeza, assegurando a aplicação do artigo 762 do Código Civil, que prevê a nulidade de contrato para garantia de ato doloso do segurado.

Outro ponto relevante a ser avaliado pelas seguradoras seria a extensão dos riscos a serem cobertos dentro do conceito de “fatos ou atos violadores de normas de anticorrupção que tenham sido provocados pelo segurado ou seu representante”. Cingindo-se apenas à Lei Anticorrupção (Lei 12.846/2013), entende-se que, se não houver a participação do agente público, a responsabilização da seguradora estaria limitada apenas aos casos de (i) promessa ou oferecimento de vantagem indevida a agente público, mas sem aceitação por parte do agente público; (ii) fraude à licitação e a contratos administrativos, mas sem a participação de agente público (ex. sobrepreço, cartel); (iii) criação de dificuldades à investigação ou fiscalização de órgãos públicos; e (iv) financiamento ou custeio dos atos previamente listados ou utilização de pessoa jurídica ou física para ocultar seus interesses e a identidade dos beneficiários de tais atos.

Também não parece adequada a responsabilização das seguradoras por atos violadores de leis anticorrupção praticados pelos tomadores que não tenham qualquer relação com o objeto do contrato amparado pelo seguro-garantia.

A limitação dos riscos por atos de corrupção assumidos pelas seguradoras deverá reduzir os custos relacionados aos contratos administrativos, especialmente ante a ampliação da relevância do seguro-garantia no projeto de nova Lei de Licitações. O incremento de custos das apólices de seguro para cobrir riscos não previstos em lei causaria prejuízo ao interesse público, já que tais custos seriam transferidos aos valores dos contratos firmados com a administração pública.

*Heloisa Uelze e Felipe Noronha Ferenzini são sócios do escritório Trench Rossi Watanabe

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