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ValorInveste: Como carregar menos peso na previdência

Fonte: Valor Econômico

SÃO PAULO - Quanto vale a troca de um plano de previdência privada que cobra do cliente 4% sobre toda aplicação que ele faz (a taxa de carregamento) e 3% para gerir os recursos por uma alternativa cuja única despesa é uma taxa de administração de 0,8%? Um ganho superior a 50% levando em conta um aporte inicial de R$ 10 mil e contribuições mensais de R$ 500 por um período de 30 anos, a um juro real (descontada a inflação) de 4% ao ano.


Na simulação feita pelo economista Marcelo d’Agosto, à frente do blog O Consultor Financeiro, do portal Valor, no primeiro plano o investidor acumularia cerca de R$ 214 mil e, na segunda opção, R$ 324,9 mil – uma diferença superior a R$ 110 mil.

Em tempo de juro baixo, negociar os custos torna-se obrigatório para não deixar na mesa todo o ganho, destaca o diretor de varejo da XP Investimentos, Eduardo Glitz. “No cenário atual, se o investidor não prestar atenção, corre o risco de passar 25, 30 anos acumulando recursos e, no fim do período, resgatar menos do que colocou, se descontada a inflação”, alerta. Para se ter uma ideia, a fim de recuperar uma taxa de carregamento de 4%, seria necessário pouco mais de um ano de aplicação, considerando um juro real também de 4%.

Por isso é preciso sair da zona de conforto e pesquisar. No varejo, destaca Glitz, ainda são encontradas taxas “abusivas”, já que esse é um mercado que acompanha a concentração bancária, e as informações não são facilmente encontradas nem comparáveis. Basicamente, os custos variam de acordo com o porte do investimento e o relacionamento do cliente com a instituição. E cada seguradora apresenta um modelo de cobrança: umas têm taxa de carregamento na entrada, outras só na saída, algumas na entrada e saída, e há quem não cobre nada.

As taxas são apenas parte do modelo complexo da previdência aberta, que envolve ainda a escolha do plano (PGBL ou VGBL), da tabela de imposto que vai incidir sobre sua aplicação, se progressiva ou regressiva, e do tipo de fundo de investimento que vai receber as aplicações, se renda fixa, multimercado ou composto com até 15%, 30% ou 49% em ações – isso tudo considerando apenas o período de acumulação.

D’Agosto calcula, com base em levantamento da consultoria NetQuant com dados da Superintendência de Seguros Privados (Susep), que há cerca de 3.600 planos individuais, entre PGBL e VGBL, que investem em menos de cem fundos. As seguradoras não informam o carregamento, mas as taxas de administração variam de menos de 1% até quase 5%. A maior parcela do patrimônio, contudo, está nos fundos mais baratos.


No segmento de renda fixa, que reúne mais de R$ 200 bilhões em ativos, pouco mais de 63% está aplicado em carteiras com taxas de administração de até 1,5%. Nos compostos, 42% do total de R$ 41,6 bilhões está nessa faixa de cobrança. Vale dizer também que esse é o intervalo que mais tem crescido nos últimos anos, aponta pesquisa da NetQuant (veja gráfico ao lado). Há algumas razões para isso.

Segundo D’Agosto, a principal delas é o aumento do interesse por planos de previdência privada de indivíduos com alto poder aquisitivo, que têm condição de avaliar melhor o efeito dos custos no tempo e negociar taxas menores. Além disso, fundos mais baratos tendem a ter um desempenho melhor relativamente às alternativas com taxas mais altas.

Sandriel Ferreira fez uso da portabilidade para trocar de plano: deixou taxas de carregamento de 5% e de administração de 3% para uma opção com taxas de zero e 1,5%, respectivamente

Outro motivo é o investidor que começa a ficar preocupado com a queda da rentabilidade de suas aplicações e passa a pesquisar alternativas. Este é o caso do carioca Sandriel Genuíno Ferreira. Aos 35 anos, ele fez uso de um instrumento que só a previdência tem no universo dos investimentos, a portabilidade, e trocou de seguradora.

Ferreira saiu de um plano que começava com 5% de taxa de carregamento e cobrava 3% de administração por uma opção sem carregamento e com 1,5% de administração, oferecida por uma seguradora independente. O primeiro investimento foi feito em 2004, com dinheiro que estava na poupança, por sugestão de um gerente do banco no qual tinha conta – na época, Ferreira trabalhava com carteira assinada no ramo têxtil. “Foi a partir daí que comecei a me interessar pelo mercado, ter alguma noção, mas não tinha tempo”, diz.

Em 2007, ele se formou em administração, o que fez seu gosto por finanças aumentar. Há cerca de três anos, ficou desempregado e resolveu mergulhar de vez no mercado. Buscou cursos para aprender a investir na bolsa, virou “trader” e, de quebra, descobriu uma alternativa mais barata na previdência, que representa fatia de 70% dos seus recursos – a diferença é dinheiro reservado para operar na bolsa. “A gestão do fundo também está melhor”, afirma.

É verdade que Ferreira já tinha acumulado R$ 60 mil no plano original, o que certamente facilitou a portabilidade para um fundo mais barato. Mas um levantamento feito pela ValorInveste com as maiores seguradoras mostra que o setor já começa a se mexer a fim de garantir competitividade.


As instituições independentes, por exemplo, costumam cobrar taxa de carregamento apenas na saída, em percentual que decresce até zerá-la, conforme o prazo de permanência (veja tabela ao lado). Na Icatu Seguros, conta o superintendente comercial Sergio Prates, a taxa zera a partir de três anos.

Há cerca de três meses, a Caixa Previdência acompanhou este modelo e tirou o carregamento de entrada dos planos novos. “Trocamos pela taxa de saída, porque, se o plano de previdência é de longo prazo, o cliente acaba não pagando nada”, explica o diretor Juvêncio Braga. Na Caixa, a taxa também zera depois de três anos. “A queda da taxa de juros está forçando a indústria de fundos em geral e de previdência a rever seus custos”, acredita.

A HSBC Seguros também já tinha mexido em algumas taxas há cerca de dois anos, quando os juros experimentaram níveis mais baixos, conta o diretor Fu Hai. A instituição passou a trabalhar com uma taxa de carregamento menor na entrada, além da cobrada na saída.

Os clientes com maior poder aquisitivo, segundo o executivo, ganharam opções de fundos mais baratos, com taxas de administração de 0,8% e 1,5% ao ano. “Achamos que quem já tinha acumulado um volume razoável de recursos merecia tratamento diferenciado”, conta. Para contribuições menores, que na HSBC começam em R$ 50, as taxas chegam a 3%.

“As taxas na previdência já vêm caindo. Embora existam fundos que cobram 3% ou 4%, são carteiras que carregam patrimônio do passado, de clientes antigos”, afirma o superintendente de produtos da Brasilprev Seguros e Previdência, João Batista Mendes Angelo.

“Tudo é questão de escala. O Brasil está amadurecendo e, à medida que o patrimônio do setor cresce, como já vem acontecendo, vai havendo reduções, mas é um caminho que tem de ser trilhado tranquilamente”, diz Angelo. Ele afirma, contudo, que nos segmentos com tíquetes menores, a partir de R$ 25,00 na Brasilprev, o espaço para redução das taxas (em torno de 3%) é menor. O grande desafio, continua, é dar acesso a pequeníssimos investidores ao mercado, por conta dos custos fixos altos.

O superintendente-executivo de previdência do Santander, José Carlos de Paula, destaca que a previdência é mais complexa do que as demais alternativas de investimento. “A seguradora tem de fazer gestão atuarial, fiscal, de investimento, o que demanda gente especializada em todas as áreas”, afirma. Mas ele reconhece que, especialmente no segmento de renda fixa, onde está alocada a maior parcela do patrimônio, há espaço para queda.

Na avaliação de Glitz, da XP – que distribui fundos de previdência de seguradoras independentes na sua plataforma aberta de produtos –, no segmento de renda fixa, o investidor deve buscar taxas de administração de até 1% e zero de carregamento. Vale lembrar que, em grupos como o Santander e o Itaú Unibanco, as taxas variam de acordo com os investimentos totais do cliente na instituição.

O Itaú, conta o diretor-executivo Osvaldo Nascimento, aposta na estratégia de tratar a previdência como parte de uma cesta de opções de investimento. “Ela não disputa espaço com fundos tradicionais, CDBs, poupança, mas é oferecida para os projetos de longo prazo do cliente”, diz. As taxas de administração, segundo Nascimento, são equivalentes às cobradas nos fundos tradicionais e variam conforme o volume global de investimentos do cliente na instituição. “À medida que o cliente aumenta o patrimônio no banco, a taxa cai. Isso vale tanto para a previdência como para os fundos tradicionais.”

Angelo, da Brasilprev, ressalta que o investidor, mais do que os custos, precisa olhar a performance dos fundos. “Pode ter fundo que cobra mais, mas entrega serviço e valor em gestão”, diz. O cliente tem de ir atrás de um bom fundo com uma boa taxa de administração, resume Prates, da Icatu. Com a taxa de juros declinante e o instrumento da portabilidade, o mercado vai acabar regulando o preço, acredita Nascimento. “Se o investidor achar que seu fundo não é competitivo, ele migra para outro plano e empresa”, afirma. Nas seguradoras independentes, por exemplo, as taxas máximas de administração estão em 2,5%.

Na portabilidade de previdência, a grande vantagem é que o investidor pode mudar de um plano caro para um com taxas mais baixas, de um fundo de renda fixa para um com ações, de uma seguradora para outra, sem pagar imposto. Os recursos não saem do sistema.

Benefício fiscal

Se os custos forem competitivos, para projetos de longo prazo, a previdência é quase unanimidade no mercado. Aplicações feitas num PGBL, voltado para quem faz a declaração completa de Imposto de Renda (IR) e tem renda acima de R$ 5 mil, podem ser abatidas até o limite de 12% do rendimento bruto anual, tributado em até 27,5%. Trata-se, no entanto, de um diferimento fiscal, uma espécie de adiamento, já que o imposto vai ser pago no plano no momento do resgate, sobre o valor total.

Se o investidor optar pela tabela regressiva, cuja alíquota começa em 35% para prazos de até dois anos e chega a 10% depois de dez anos, tem a possibilidade de conseguir um desconto em relação ao imposto na declaração de IR. Para aplicações superiores a dez anos, o investidor escapa de uma alíquota de 27,5% no início do período de aplicação para pagar 10% só no fim do prazo. “Esse prêmio não encontro em nenhum outro segmento”, afirma Angelo, da Brasilprev. O ideal é aplicar essa economia (17,5%), a fim de alavancar a poupança. “Esta é uma forma de incrementar os resultados que o cliente não percebe”, diz José Carlos de Paula, do Santander.

No VGBL, opção indicada para quem faz a declaração de IR no modelo simplificado ou já usou todo o espaço do abatimento do imposto no PGBL, não há a possibilidade de abatimento no IR. No entanto, os recursos acumulados não sofrem a incidência do come-cotas, imposto cobrado semestralmente nos fundos tradicionais. “O investidor acumula o tempo todo sem pagar imposto”, destaca Braga, da Caixa. A tributação acontece no momento do resgate e apenas sobre o rendimento.

No Santander, para o investidor que tem objetivos de longo prazo, a dica que se costuma dar é direcionar pelo menos 15% dos recursos disponíveis para aplicação para a previdência, diz De Paula. Mas o horizonte tem de superar cinco anos para que se consiga tirar proveito dos benefícios fiscais, alerta.

Hoje, com juros declinantes, tudo o que investidor fizer para ter um ganho adicional, seja negociar custos mais baixos, seja aproveitar os benefícios fiscais que a previdência oferece, pode resultar em uma diferença grande. A diretora de previdência e vida resgatável da Mapfre Serviços Financeiros, Maristela Gorayb, vai além: na previdência, as pessoas precisam começar a pensar em assumir mais risco nas suas aplicações, com a inclusão de renda variável. “Isso vai ser inevitável, mas é uma questão de experimentar e ver que dá efeito.”

Em uma simulação da Icatu, Prates conta que, quando o juro real estava em 6% ao ano, uma pessoa de 30 anos, para se aposentar aos 60 com R$ 500 mil, tinha de contribuir com um pouco mais de R$ 500 por mês. Com essa taxa de juros caindo para 3,5%, as contribuições deveriam subir para quase R$ 800 por 30 anos para alcançar o mesmo saldo, ou a aposentadoria precisaria ser adiada por quase nove anos. Não dá para perder tempo. É hora de fazer contas.

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