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Mudança de ritmo

Fonte: Valor Econômico 

A agenda errática de 2018 pode ter levado volatilidade adicional à indústria da previdência. Mas não foi o suficiente para brecar seu crescimento. Mesmo com ritmo de captações desacelerado e sem fôlego para avançar os 20% registrados anualmente durante mais de uma década, o resultado líquido foi positivo de R$ 22,6 bilhões nos oito primeiros meses do ano. E, apesar de representar queda de 34% em relação ao registrado no mesmo período de 2017, refletindo os efeitos da crise econômica, esse é um mercado ainda pouco desenvolvido no Brasil comparativamente a outros países, o que leva seus principais agentes a se manter otimistas em relação ao futuro.

Os números mostram que a previdência completar aberta ultrapassou a casa dos R$ 800 bilhões e, se somada à fechada, dobra de tamanho. Mesmo assim, representam só 23% do Produto Interno Bruto (PIB) nacional, enquanto no Chile o percentual salta para 70%, e nos Estados Unidos, para 135%. "Fazendo uma conta simples: se tivéssemos a penetração chilena, ao invés de R$ 1,6 trilhão, saltaríamos para R$ 4,7 trilhões em recursos alocados em previdência no Brasil", avalia Edson Franco, presidente da Federação Nacional de Previdência Privada e Vida (FenaPrevi) e presidente da Zurich Brasil.

O executivo salienta que pela primeira vez o atual cenário de juro baixo e inflação sob controle cria as condições necessárias para a formação de poupança de longo prazo, que até pouco tempo não existiam. "Há uma demanda represada e a discussão da reforma da Previdência reforça essa preocupação de proteção futura."

A maior consciência da sociedade de que está vivendo mais e que terá que se preocupar com os gastos na velhice também é vista como fator positivo para o avanço do setor. "A longevidade leva as pessoas a perceberam que precisam se programar e esse é um recurso sagrado para elas. Mas em algum momento pode haver dificuldades no curto prazo", alerta Marco Barros, presidente da Brasilprev, que detém 30% de participação neste mercado, com R$ 248,5 bilhões.

A empresa também sentiu o desempenho pior deste ano, com diminuição em 59% na captação líquida registrada até agosto, de R$ 4,3 bilhões, se comparada ao mesmo período de 2017. "As pessoas mostram que não querem sair do sistema, mas sofrem efeitos das crises momentâneas e têm muitas vezes que adiar projetos de vida", diz Barros. O executivo defende, no entanto, que virá uma nova onda de crescimento da massa de renda do país que remeterá o setor à pujança do passado.

Há um consenso entre os agentes deste mercado de que o investidor em previdência está hoje bem mais maduro do que no passado. E mesmo diante de fundos que apresentam liquidez diária, diferentemente de outros países como nos EUA, as pessoas resistem mais a sacar os recursos dessa modalidade de investimento. "O que acontece menos em outras classes de ativos. Não vão tirar o dinheiro da previdência, por exemplo, para consumo imediato. Tem mais resiliência porque é recurso de longo prazo", explica Claudio Sanches, diretor de investimentos e previdência do Itaú Unibanco.

Com captação líquida até agosto de R$ 7,9 bilhões, 18% inferior aos primeiros oito meses de 2017, a expectativa é de arrecadar mais R$ 3 bilhões nos últimos meses do ano. O que elevaria seu patrimônio líquido (PL) para mais de R$ 183 bilhões. Mas Sanches alerta que avançar em bases muito grandes não é tão simples assim e que o mercado cresceu muito nos últimos anos porque também houve migração de dinheiro de outras modalidades de investimentos para a previdência. "E isso foi correto. Mas hoje, o volume de dinheiro que as pessoas já têm em previdência, comparado com os recursos totais, gira entre 25% e 30%. O que considero um teto razoável. O crescimento daqui para frente deve vir do avanço do bolo da economia", avalia.

As incertezas em relação ao processo eleitoral e a consequente alta volatilidade no mercado, no entanto, têm afetado o humor do investidor, que ficou mais cauteloso e arisco. O ambiente instável provoca ainda maiores doses de conservadorismo. "Principalmente no varejo de mais alta renda, que acompanha o noticiário de forma mais atenta e busca 'linkar' o cenário eleitoral ao que vai acontecer com a economia. Nessas horas, não querem tomar muito risco", considera Sanches.

O executivo diz que esse movimento vem ocorrendo de modo mais perceptível nos últimos dois meses, o que tem provocado também mais conservadorismo por parte dos gestores na alocação de recursos, ao optarem por ativos menos instáveis.

Para virar o jogo de um ano considerado fraco e adequando-se ao cenário atual, o Bradesco está lançando nesta semana dois produtos apostando na gestão dinâmica de seus ativos. Fechou parceria com quatro gestores independentes e, num primeiro momento, oferecerá o novo portfólio aos clientes de alta renda, com ativos aplicados a partir de R$ 1 milhão, e ao private, com R$ 5 milhões ou mais. Justamente as duas categorias nas quais houve maior volume de resgates no ano.

Com um total de R$ 223 bilhões em reservas de investimentos em previdência, a seguradora ficou com captação líquida negativa em R$ 300 milhões até agosto, apesar do aumento do número total de participantes, que saltou de 2,8 milhões para 3,1 milhões, se comparado ao mesmo período de 2017. "O modelo de 'asset allocation' dos novos fundos permitirá acessar várias classes de ativos diferentes em um mesmo plano", afirma Jorge Pohlmann Nasser, diretor-presidente da Bradesco Vida e Previdência e da Bradesco Capitalização.

Já o Santander espera por uma recuperação neste final de ano, que costuma representar até 40% do total de suas vendas. Para tanto, antecipou para o início de setembro uma campanha publicitária em massa. "Estamos zerando as taxas de carregamento de entrada e de saída de recursos. E queremos bater os R$ 2 bilhões em captação líquida em 2018. O mesmo de 2017", diz Alfredo Lalia, presidente da Zurich Santander no Brasil. Até agosto, esse resultado do banco estava em R$ 300 milhões, 80% menos do que o registrado no mesmo período do ano passado, e o total de PL em previdência em R$ 42 bilhões.

Apostando em uma retomada da economia pós-eleições, o executivo já faz planos para 2019. "Queremos dobrar a captação líquida e fazer R$ 4 bilhões no ano que vem. Hoje, temos 6% de market share e a meta é atingir entre 10% e 11% em quatro anos", afirma Lalia.

Das seguradoras independentes - sem banco atrelado -, o Grupo Icatu é o que tem avançado em ritmo mais veloz. Foi uma das primeiras seguradoras a abrir sua arquitetura de investimentos e pulverizá-la em parceria com outros gestores de recursos - hoje são mais de 65-, puxando um cordão que atualmente tem aderência de quase todos os grandes bancos.

E apesar de também ter desacelerado o crescimento, não teve captação menor do que a do ano anterior. Pelo contrário. Saltou de R$ 2,6 bilhões, de janeiro a agosto de 2017, para R$ 3,04 bilhões este ano. O total de suas reservas bateu em R$ 21 bilhões, e a meta é chegar em R$ 23 bilhões ao final de 2018. "A previdência virou um produto de primeira necessidade do brasileiro e, mesmo na turbulência, tem sido priorizada. Óbvio que o tema da reforma da Previdência Social ficou mais latente na cabeça das pessoas", avalia Luciano Snel, presidente do Grupo Icatu.

O executivo alerta, no entanto, que a ausência de algumas regras criam entraves ao crescimento mais pujante do setor. "Como a falta de incentivo fiscal para que pequenas empresas que declaram o Imposto de Renda pelo lucro presumido ofereçam este benefício a seus funcionários", considera Snel.

No caso da SulAmérica, a aposta é de que quem tem maior poder aquisitivo é que irá puxar a retomada do avanço mais acelerado da indústria, que deve vir já em 2019, com a recuperação tanto de arrecadação quanto de captação líquida.

"A retomada da economia deve aumentar o poder aquisitivo das classes A e B entre 4% e 6%. Se considerar que 80% da previdência é composta por esse público, parte desse ganho de renda pode vir para o setor", avalia Marcelo Mello, vice-presidente da seguradora, que registrou no ano R$ 210 milhões em captação líquida, revertendo o resultado negativo de janeiro a agosto de 2017, de R$ 396 milhões.

O executivo credita ainda aos mais endinheirados o avanço de sua reserva, que atingiu R$ 6,7 bilhões. "Produtos para quem tem renda entre R$ 5 mil e R$ 17 mil mensais, e também o público private, têm puxado o avanço maior na nossa carteira", afirma Mello.

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